30/11/2006

"São mais as vozes que as nozes."

Explicação da origem da expressão pelo filólogo brasileiro João Ribeiro:
«A forma primitiva do provérbio é outra. Com varas batem-se as nogueiras, faz-se grande estardalhaço e às vezes as nozes que caem são poucas. Ao fragor demasiado não correspondem os poucos frutos que se colhem. Daí o dizer-se É mais o ruído que as nozes.
É esta a forma com que se encontra na Arte de furtar > quando diz o autor: "A um milhão de emprego claro está que deve corresponder um grandioso lucro; e tal lho deixam recolher, sem se advertir que é maior o arruído que as nozes." Cap. XX, n.59.
O que ainda agrava este caso, é que ao partir as nozes o ruído é grande e o miolo por vezes não há. Somadas as razões é verdade que é mais o ruído do que a noz, ou como diz o poeta dos Ratos da Inquisição>, 167:
"Mais são as vozes que as nozes
P'ra mim n'esta ocasião...
"

Em português preferimos voz a ruído porque voz ruído é, e é rima, e segundo entendo é mais do que rima, é simpatia. Há verdadeira atracção nas formas familiares dos pronomes e noz=nós, desperta vós= voz. E por tanto nozes e vozes, como é também o caso de tiques/miques.
A palavra voz podia perfeitamente substituir a de ruído, pois que significava clamor, grito.

Na Demanda do Santo Graal que é um dos documentos do português arcaico>, vem a expressão em toda a intensidade: "Quando a donzella esto viu, leixou-se caer em terra dando vozes como mulher sandia."pg.93

Nas antigas leis -dar vozes-era gritar o -a que d'el rei! e este sentido (voz=grito) ainda se conserva nos dizeres -À voz do comando; À voz de marche! etc..

Nota: Também existe a locução -vir à noz - que se tornou proverbial, naturalmente pelo equívoco ou frequência do vir a nós (venha a nós -da oração dominical). Vir à noz diz-se da corda da besta que se estica e entesa até alcançar o rebaixo próprio ( a noz). Foi usada na comédia Ulissipo: "Eu também já vou entrando em jogo com a minha gaita, que parecia impossível vir à noz."»

João Ribeiro, FRAZES FEITAS -Estudo conjectural de locuções, ditados e proverbios (Livraria Francisco Alves, Rio de Janeiro, 1908)

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1 comentário :

Anónimo disse...

Olá
A propósito dos provérbios apeteceu-me deixar aqui uma lembrança sobre o João César Monteiro que tão bem utilizava os provérbios nos seus maravilhosos filmes.
Alexandra