04/04/2008

Azul nítido


Omphalodes nitida

Enquanto as herbáceas mais altas, e mais tardias, não se impõem, é tempo de explorar as cores com que as de menor estatura matizam agora os campos. O azul mais apelativo é da responsabilidade das boragináceas que apreciam a humidade que resta do Inverno e o sol menos agressivo do início da Primavera. Façamos portanto como os antigos colectores de plantas, peritos a quem não escapava a forma de uma nervura ou o tamanho de um estame e cuja missão era recolher um exemplar para conservação, informações sobre o terreno, a vizinhança ou a abundância de tais espécimes, e classificá-los; depois, e porque a memória nem sempre é de confiança, guardavam todos estes dados em cadernos de capa dura, onde espalmavam os exemplares colhidos e os rodeavam de texto científico para que o futuro soubesse tanto como eles.

Com a filosofia desses naturalistas, comecemos por escolher um azul - etapa árdua sendo todos tão atraentes e sobretudo tão semelhantes ao do miosótis. Hesitantes, podemos optar por um azul de tamanho médio, como o de uma Omphalodes nitida. E reparar desde logo que é uma ervinha com cerca de 30cm de altura e folhas em tom verde-claro acetinado (nitidum), com alguma penugem, sendo as basais maiores e mais redondas. As flores têm cerca de um centímetro de diâmetro, agrupam-se no topo dos caules, e as cinco pétalas, assinaladas por traços descoloridos, unem-se num tubinho cuja entrada é controlada por cinco abas minúsculas em forma de V. No fim do Verão poderemos confirmar que as sementes nascem em invólucros com uma asa e uma reentrância que lembra um umbigo (omphalós).

Se o constranger, como a nós, arrancar um exemplar da terra, pode desenhar cuidadosamente cada detalhe, pintando com minúcia as gradações de cor e textura. Recordará o prazer da infância em prencher um herbário sem o risco do conteúdo descolar ou se degradar com a idade.

2 comentários :

Paulo disse...

Depois de colhidas ficam sem graça. Falta-lhes a companhia das amigas, soçobram.
Mas pegar no cavalete e pintar esses azuis, conseguir finalmente o tom certo, encontrar a nota que faltava, não é tarefa fácil. Ou a mão é firme ou lá se vai a nitidez.

Maria Carvalho disse...

Para quem fotografa tão bem como o Paulo, a pintura é redundante. Ela é recurso para os que ainda olham à moda antiga: em vez de voltarmos do passeio com um cartão de memória cheio de imagens raw, a natureza toda lá apertadinha e policiada pelos gigabytes, carregamos calhamaços de páginas soltas envergonhadas com os esboços imperfeitos.