14/10/2009

Aprendendo a ser pássaro


Castanheiros (Castanea sativa Mill.) vistos do Treetop Walkway - Kew Gardens

Uma das frustrações de quem vai à cata de castanhas, agora que é quase chegado o tempo delas, é a safra depender da boa vontade da árvore. Se ela não nos quiser presentear com os seus frutos, não há como demovê-la a deixá-los cair. Conformados com tais caprichos, voltamos uns dias depois - altura em que constatamos, com mal contida fúria, que alguém se nos antecipou, colhendo tudo aquilo que por direito de prioridade nos pertencia. É deplorável o ponto a que chegou a falta de civismo neste nosso desgraçado país.

Foi decerto para resolver este problema que, na esclarecida e cívica Inglaterra, se inaugurou em Maio de 2008, nos Kew Gardens, esta estrutura metálica com 18 metros de altura, que proporciona aos colectores de castanhas um circuito de 200 metros bem ao nível da copa das árvores. Árvores essas que são, quase todas elas, castanheiros carregadinhos com a promessa de deliciosos magustos. Basta o visitante esticar os braços - com as mãos de preferência protegidas por grossas luvas de cabedal - e ir enchendo com ouriços o balde que teve a previdência de trazer consigo.

Acontece que em Agosto, quando visitámos os Kew Gardens, ainda era cedo para a colheita. Voltarmos lá agora com esse único fito seria algo extravagante, mas fica a sugestão para quem puder aproveitá-la. Quanto a nós, estamos de olho nuns tantos castanheiros em várias localidades do norte do país; seria porém de uma generosidade inaudita, própria de uma santidade a que não aspiramos, revelar ao leitor o paradeiro dessas árvores.

3 comentários :

Rafael Carvalho disse...

Bela ideia!
Já abracei o tronco de muitos castanheiros...
...Outros pela sua dimensão não consegui abraçar!...
Sendo mau trepador, nunca tive a hipótese de me passear pelas suas copas.
Continuação de boas postagens.

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

Olá Paulo,

Confesso-me dividido quanto a esta estrutura.

Se entendo o seu objectivo e invejo a possibilidade de ver as árvores ao nível de um gigante, ou com um olhar de pássaro, estou indeciso quanto ao impacto da mesma na paisagem.

Paulo Araújo disse...

Olá Pedro.

Como o caso do Jardim dos Santos, em Lisboa, deu tanta e justificada celeuma, pode parecer, ao publicar isto, que estou a alinhar pelos «maus» - quer dizer, por aqueles que gostam de atafulhar os jardins com coisas estapafúrdias que desvirtuam a sua vocação essencial. Também por isso não sou de facto um entusiasta incondicional desta estrutura. Tanto assim que já tinha tido oportunidade de a visitar em idas anteriores aos Kew Gardens e só agora, em Agosto, o fiz.

Perguntas pelo impacto na paisagem. É praticamente nulo. Os terrenos onde estão os Kew Gardens quase não têm relevo, e a construção fica completamente oculta pelas copas das árvores (pelo menos enquanto todas elas têm folhas). Além disso, apesar de as árvores ficarem tão perto, o passadiço não chega a tocar-lhes. Falta saber se alguma árvore foi abatida ou prejudicada para se erguer a construção. Francamente não sei dizer. Parece-me que o compasso de plantação das árvores nos Kew Gardens (em geral não estão encavalitadas umas nas outras) permitiria, sem grandes contorcionismos, erguer uma coisa destas sem necessidade de sacrificar árvores.

(E é claro que gostei de andar lá por cima.)