17/05/2010

Cães & companhia



Lobaria scrobiculata (Scop.) DC. (1.ª foto) / Peltigera membranacea (Ach.) Nyl. (2.ª e 3.ª fotos)

Já antes explicámos que um líquen é uma associação simbiótica de dois organismos, uma alga e um fungo. Mas ficou por exemplificar a extraordinária diversidade desses seres. O líquen-das-renas, que ilustrou essa prosa, quase consegue fazer passar-se por uma planta normal, dotada de caule e com uma ramificação bem definida. Nas fotos acima, que foram obtidas na Mata da Margaraça e mostram duas espécies ocupando habitats semelhantes, temos dois exemplos de líquenes foliformes. Tais líquenes têm a aparência de uma membrana que, à laia de papel de parede mais ou menos descascadiço, vai cobrindo superfícies diversas: troncos de velhas árvores, rochas, muros rústicos.

Joana Marques (que identificou o primeiro líquen, embora a foto não lhe permita ter absoluta certeza) escreve que «a Lobaria scrobiculata é uma epífita de troncos de carvalhos, castanheiros e oliveiras, e, porque bastante sensível, um dos indicadores de estabilidade dos bosques. Pode também colonizar muros nas proximidades de bons carvalhais. A cor azulada é característica quando o talo está húmido, sendo verde água quando seco, e vêem-se umas estruturas chamadas sorálios, de cor cinzenta, que são propágulos vegetativos.»

A Peltigera membranacea, ou líquen-dos-cães (dog lichen em inglês), gosta de rochas húmidas, onde cresce na companhia de uma profusão de musgos. Exibe uma variação cromática acentuada: castanho quando ainda fresco, torna-se de um cinzento azulado ao secar. Os rolos alaranjados que se observam numa das fotos contêm os esporos que se vão encarregar da propagação da espécie. A designação dog lichen vem-lhe dos «dentes» aguçados (ou rizinas) que sobressaem da parte inferior, branca e de textura esponjosa. Pelo mesmo motivo, uma sua congénere chama-se Peltigera canina e já houve quem recomendasse estes líquenes - supõe-se que com eficácia nula - como remédio contra a raiva: depois de secas e pulverizadas, as «folhas» eram misturadas em leite ainda morno da vaca; durante quatro dias consecutivos, os pacientes deveriam tomar em jejum, logo pela manhã, a beberragem resultante, que tinha acentuado sabor a mofo.

Como entretenimento visual, fica o convite para folhearem estas duas páginas com fotos de centenas de espécies de líquenes.

P.S. Agradecemos a Joana Marques as importantes correcções que fez à primeira versão deste texto.

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