23/11/2013

Planta de estimação


Odontites viscosus (L.) Clairv. subsp. australis (Boiss.) Jahand. & Maire


As inflorescências em espiga e as flores amarelas, de corola bilabiada e interior difícil de espreitar, fazem lembrar as da Odontitella virgata, mas há detalhes que as diferenciam — nos sulcos da flor, no aroma, no tomento e no visco que as revestem, e até no pólen — e que o olhar ensinado dos botânicos detecta, justificando a separação dos géneros. São, porém, ambas semi-parasitas, por isso pouco exigentes com o solo onde lhes calha nascer, mesmo que seja perturbado, seco ou exposto, embora não desdenhem de um bosque fresquinho de azinheiras, pinheiros, carvalhos ou outras árvores perenes. Naturalmente, aquilo a que chamamos parasitismo entre as plantas pode ser de facto um negócio vantajoso cujas contrapartidas desconhecemos. Ou, quem sabe, as plantas parasitas são os gatos e cachorros das outras, alimentados em troca de companhia e brincadeiras a tentar caçar o vento. Não se pode prever que talentos teremos desenvolvido daqui a uns milhões de anos, mas talvez nessa altura consigamos ouvir as plantas a crescer, a espreguiçar-se depois de um longo sono, algumas a ronronar.

Sendo planta anual, o exemplar que vimos florido numa encosta calcária, junto da população de Nothobartsia asperrima, não estará lá no próximo Verão. Esperemos que a descendência seja farta porque parece planta rara, de cuja ocorrência há registos apenas na Estremadura e Ribatejo. Para essa escassez, por certo contribui o baixo número (muito menor que os das outras espécies do género) de sementes por cápsula, algumas delas, caprichosamente, nem sequer viáveis.

Das nove espécies do género Odontites descritas pela Flora Ibérica, apenas duas são conhecidas em Portugal: além da das fotos, nativa do sudoeste da Europa e noroeste de África, ocorre a Odontites vernus, de flores rosa ou púrpura, que, embora tenha uma distribuição mais ampla, ainda não encontrámos.

5 comentários :

ZG disse...

Mais uma maravilha que nunca tínhamos visto!
Mais uma vez, parabéns pelo vosso blog, que deve ser o melhor blog português!!

ZG disse...

Já agora, por fsvor, qual o local e a data em que encontraram a formosa (e tão rara) planta?

bea disse...

Espanta-me o facto de florescerem em meio tão inóspito, por entre as pedras que, como diz Mia Couto, seguram a terra de fugir. Plantinhas corajosas, que ali se resolvem a viver e dar flor.
É de admiração. Rareando, ainda maior.

Paulo Araújo disse...

Caro ZG:

As fotos foram tiradas em 25/VIII/2013 na serra de Aire, um pouco acima do parque de merendas do Barreiro Valvão, a cerca de 520 m de altitude.

Carlos M. Silva disse...

Olá

É bem bonita, sim.
Se a outra já vi mas apenas em Léon,e portanto não cá dentro, esta nem cá nem lá fora!
Pode ser que um dia tenha sorte.
A rosa achei-a muito delicada e bela; e este amarelo também me atrairá o olhar caso me cruze com ela.
Obrigado por continuarem a distribuírem conhecimento e prazer.

Carlos M. Silva