17/03/2014

Redonda vezes quatro



Galium rotundifolium L.


Não é sintoma de chauvinismo, e muito menos conversa de operador turístico, reconhecer que às vezes o que é só nosso é melhor do que aquilo que partilhamos com muitos outros países. Na maioria dos casos, essa supremacia é puramente fortuita e não fizemos nada para a merecer. Além disso, e como sucede com quase tudo do que tratamos no blogue, o assunto interessa a tão pouca gente que não será com ele que se fortalecerá o depauperado orgulho nacional. Falando das plantas do género Galium, a que os ingleses chamam bedstraw e nós não chamamos nada, as mais arrumadinhas, simétricas e elegantes que encontramos no nosso país distinguem-se por ter quatro folhas em cada nó, cada uma delas com três veios longitudinais bem vincados. É esse o figurino tanto do Galium broterianum como do Galium rotundifolium, que aqui trazemos hoje. O primeiro é frequentador assíduo de margens de cursos de água no interior norte e centro do país; o segundo, que mora no mesmo território mas prefere matas caducifólias, é muito menos comum. O primeiro tem uma inflorescência abundante e vistosa, composta por dezenas de pequeninas flores brancas; o segundo tem uma inflorescência rala, como se tivesse sido podado fora de época por um jardineiro inconsciente. Finalmente, o primeiro é só nosso ou quase (tratando-se de um endemismo ibérico, somos obrigados a partilhá-lo com os espanhóis), enquanto o segundo tem uma distribuição vastíssima, que vai desde a Península Ibérica e o Mediterrâneo até à Escandinávia e ao sudoeste da Ásia. Por uma vez, temos em abundância o que é melhor e mais bonito, e que os outros não têm, embora, por compulsão coleccionista, não abdiquemos de ter igualmente, mas em quantidades moderadas, o produto de menor qualidade que os outros também têm.

O G. rotundifolium é uma planta perene, estolhosa, capaz por isso de revestir largos metros quadrados de terreno no sub-bosque de carvalhais ou de soutos. Tem folhas arredondadas (daí o epíteto atribuído por Lineu) com cerca de 1,5 cm de comprimento e pecíolo muito curto, e caules de 30 ou 40 cm de altura encimados por inflorescências esparsas, corimbiformes, compostas por flores brancas com 3 a 4 mm de diâmetro. Floresce de Junho a Julho. A quem quiser vê-lo de perto aconselha-se uma visita ao Souto do Concelho, em Manteigas, ou à Mata da Margaraça, na serra do Açor, local onde as fotos foram obtidas e que justifica muitas visitas pelas razões aqui detalhadas.

3 comentários :

Francisco Clamote disse...

Olhos que não conhecem, olhos que não vêem, digo eu que já passei pela Mata da Margaraça, várias vezes e nunca me apercebi deste "Galium".

bea disse...

Primeiro: podemos ser poucos, mas somos persistentes; e sempre admirei as plantas de folha perene, as que, haja o que houver, não se descabelam e permanecem “a pegar o toiro pelos cornos da desgraça”.
Segundo: é bem bonitinho e simétrico o brotar das folhas na plantinha que é só nossa.

Paulo Araújo disse...

Obridado pelo comentário, Bea.

Francisco:
Nós também não vimos este Galium nas primeiras visitas à Margaraça. Tem uma floração algo tardia, e só em Junho é que fica mais visível. E não é particularmente abundante por lá. Só o vimos na parte baixa, quase no limite nascente da mata, num daqueles caminhos que não têm saída.