18/11/2014

As duas vidas do sabugueiro

Passeávamos por um juncal na foz do rio Coura, que em Caminha se une ao rio Minho, quando, entre muitos pés de Samolus valerandi e Centaurium spicatum, vimos uma fiada de arbustos que nos pareceram sabugueiros em flor. Porém, a memória guarda, para nossa segurança, um razoável guião do mundo que já vimos, e é por isso capaz de uma vigilância que chega a surpreender-nos: apesar de fazerem lembrar os sabugueiros comuns, estes sabugueiros minhotos tinham textura herbácea (o S. nigra tem caule e ramos lenhosos) e as suas folhas, de cor verde-alface, exibiam pínulas anormalmente grandes. Para reforçar a estranheza, as anteras (onde está o pólen) eram de cor púrpura, não amarelas como as do Sambucus nigra.

Lembrámo-nos de que já havíamos lido aqui sobre uma outra espécie de Sambucus espontânea em Portugal continental. Confirmámos então que o que encontrámos em Caminha foi mesmo o S. ebulus, apesar de oficialmente em Portugal ele só ocorrer no Algarve, Alto Alentejo, Beira Alta e Trás-os-Montes. Sabemos agora que à lista deve acrescentar-se o Minho, terra de muitos ribeirinhos e bosques como os sabugueiros gostam.



Sambucus ebulus L.


Esta é uma erva estolhosa, perene e com rizoma, que pode atingir os 2 metros de altura (o S. nigra sobe mais, até aos 10 m) e exala um odor característico dos sabugueiros, que nos parece nauseante mas que atrai muitos polinizadores. Os frutos são bagas que amadurecem negras enquanto as folhas ganham o tom alaranjado de Outono.

O nome científico, atribuído por Lineu em 1753, não tem parentesco com o vírus doentio, mas o epíteto talvez se refira, como no caso do rio Ébola (de «águas brancas») no Congo, à medula esbranquiçada dos caules, o sabugo.

5 comentários :

bea disse...

Pronto, lá vem o sabugueirinho, erva que pode atingir 2 metros de altura. Para uma erva não está nada mal.

Maria Carvalho disse...

Diz bem, bea: não sabemos a partir de que altura uma erva deixa de se chamar assim.

Francisco Clamote disse...

Fico-lhe grato, Maria Carvalho, pela referência ao meu modesto "site". Saudações cordiais.

Carlos M. Silva disse...

Olá

Espanto-me não só com o que aqui colocam para leitura mas também com a vossa 'surpreendente memória' do que já viram, sempre prontos para uma qualquer surpresa.
Obrigado e abraço.

Carlos

Anónimo disse...

O local onde o vi no Algarve já se encontra destruído. A linha de água foi entubada e por cima construiu-se uma estrada.
Nunca mais voltei a encontrar esta planta. É bom saber que vai aparecendo e surpreendendo por aí.
André Carapeto