05/12/2015

Erva do capuz rosado


Teucrium pyrenaicum L.


Não há certezas sobre como e quando apareceram os primeiros olhos no planeta, mas registos fósseis com muitos milhões de anos comprovam que começaram por ser muito simples, meros cristais sensíveis à luz e ao brilho ambiente, sem um orgão óptico de suporte. Após várias etapas evolutivas mais ou menos longas, atingiram a complexidade que hoje lhes reconhecemos e adoptaram a posição anatómica cimeira, frequentemente emparelhados, que ocupam em quase todos os organismos que os têm. Terão surgido ainda a vida não tinha colonizado habitats em terra e, por isso, tiveram de se adaptar a novos comprimentos de onda, a diferentes níveis de luminosidade, à necessidade de determinar a direcção da luz, de detectar formas ou o vazio a partir da informação visual, de distinguir as cores e o perto do longe, de reconhecer objectos em movimento e de se proteger da radiação ultravioleta. Depois houve quem aproveitasse a vantagem de se orientar ou caçar guiado pela visão. Este controle de um sem número de pormenores aperfeiçoou os olhos e o cérebro, incentivando as conexões entre eles e garantindo-nos um modo eficiente, quase perfeito, de processarmos imagens e interpretarmos o que vemos.

Surpreendentemente, as plantas ficaram de fora desta história de sucesso, bastando-lhes a capacidade de orientarem a folhagem para a luz, de reconhecerem o dia e a noite, de sentirem calor ou frio, de estruturarem harmoniosamente um ciclo de vida. É como se não precisassem de tanta sofisticação anatómica: afinal, por viverem imóveis, teriam para apreciar sempre a mesma paisagem; e, tendo olhos mas não braços, como afastariam as poeiras da vista, aliviariam o incómodo de um cisco ou o risco de um insecto voar rente a um olho? Estamos a ser simplistas, claro, alguma coisa nos está a escapar: como conseguiram as orquídeas imitar a morfologia dos polinizadores para os atrair sem nunca os ter visto? E, afinal, como sabem as plantas que cores mais lhes convêm, sejam elas arrojadas, com matizes ou em combinações sedutoras, se nunca viram um azul marinho, um amarelo torrado, um verde azeitona ou um vermelho púrpura?

As flores deste Teucrium, que na morfologia seguem o figurino usual no género, singularizam-se pelo arranjo bicolor: uma cor quente para o capuz, contrastando com o branco luminoso do labelo, marcado com veios sinalizadores, onde os polinizadores devem aterrar. Tratando-se de uma herbácea perene (quase lenhosa na base) que tem de sobreviver ao frio da Cantábria, as flores nascem no Verão e agrupam-se em rosetas terminais rasteiras, com o cálice protegido por uma penugem densa. As folhas, de margem crenada e igualmente lanudas, têm pecíolo curto, não vá o vento arrancá-las. É um endemismo do norte da Península Ibérica e sudoeste de França, frequente em pastos secos e fendas de rochas calcárias da Cantábria. A Flora Ibérica distingue duas subespécies, o T. pyrenaicum subsp. pyrenaicum, com flores bicolores, e o T. pyrenaicum subsp. guarensis, com corolas de uma só cor (branco, amarelo ou creme), que, segundo se crê, só ocorre no nordeste montanhoso espanhol.

2 comentários :

ZG disse...

Mais uma extraordinária beldade cantábrica!!

bea disse...

Bem verdade. Pouco pensamos nos possíveis olhos das plantas:); porém, como dizia o aldeão da anedota, "sempre Deus fez o mundo bem feito, olha se em vez de uma bolota me tem caído na tola uma abóbora".
Parabéns pelas fotos.