19/05/2016

Flora endémica do Porto Santo: Limonium lowei


Aeroporto do Porto Santo em dia de ventos cruzados na Madeira
Como ir. Consta que há voos directos semanais de Lisboa para o Porto Santo, mas são caros e, no regresso, os aviões entregam-se a uma sesta prolongada na Madeira. Para quem não parte de Lisboa, o mais prático e barato será voar para a Dinamarca e daí tomar uma das ligações semanais entre Billund e o Porto Santo asseguradas pela Danish Air Transport. Caso opte patrioticamente pela nossa companhia aérea de bandeira, saiba que o voo do Porto para o Funchal descola às 6h30 da madrugada, e por isso nem pense em dormir nessa noite. Apesar da hora, não terá oportunidade de admirar o nascer do Sol porque as salas de embarque estão viradas para poente. Da Madeira para o Porto Santo voam uns aviõezinhos de brinquedo, a um preço por passageiro (ida e volta por 120 euros) que é toda uma lição sobre práticas monopolistas. Nos dias, três ou quatro em cada mês, em que na Madeira sopram ventos cruzados, os aviões, depois de uma demorada valsa nos céus da ilha, desistem de aterrar e são desviados para o Porto Santo. O inesperado bónus do voo directo traduz-se numa poupança de tempo mas não de dinheiro, pois ninguém é reembolsado pelo bilhete para o tal aviãozinho em que afinal não chegou a embarcar.

Onde dormir. Se nos permite a franqueza, isso é consigo. Gastou na viagem todo o dinheiro que tinha e vê-se obrigado(a) a dormir na praia? Nada temos a dizer sobre a sua escolha.

O que ver. Sobre esta questão já temos opiniões mais assertivas. Se lhe fosse permitido atravessar a pista a pé, o que em dias normais não representa qualquer perigo, poderia iniciar as suas observações da flora endémica da ilha ainda dentro do perímetro do aeroporto. No limite norte, e de ambos os lados da vedação, concentra-se a mais acessível das populações de Limonium lowei, uma planta de caule lenhoso que forma compactas almofadas verdes contrastando com os tapetes azulados de Lotus glaucus, um simpático endemismo macaronésico muito espalhado pelo litoral da ilha.




Limonium lowei R. Jardim, M. Seq., Capelo, J. C. Costa & Rivas Mart. [= Limonium ovalifolium subsp. pyramidatum]



Este pequeno limónio de folhas largas e onduladas, com 3,5 a 7 cm de comprimento, e inflorescências muito ramificadas, em panículas com uns 30 cm de altura, é uma versão algo reduzida do Limonium ovalifolium, uma planta comum em arribas e sapais da costa algarvia. Subordinado à espécie continental ou como espécie autónoma, a singularidade do limónio porto-santense sempre foi reconhecida desde que Lowe, em 1830, o descreveu como Statice pyramidatum. Igual sorte não teve o limónio açoriano, ainda hoje oficialmente chamado Limonium vulgare apesar de se distinguir claramente, até na ecologia, da espécie europeia com o mesmo nome.

Exclusivo de uma ilha tão pequena, e confinado a alguns pontos da costa norte, o Limonium lowei é necessariamente raro. O núcleo junto à vedação sobreviveu à expansão do aeroporto e ao asfaltamento da estrada que leva à Fonte da Areia. Com a falésia ali a poucos metros, a falta de espaço garante que não se farão novos alargamentos do aeroporto ou da estrada. A Fonte de Areia é uma duna fóssil gigante, que todos os dias vai largando grandes e pequenos calhaus de cor rosada que ao cair se desfazem em pó. É preferível que não nos caiam na cabeça, e esse justo receio acaba por abreviar a visita. Partindo de um parque de merendas ao abandono, guarnecido por araucárias e por esfarrapados guarda-sóis de palha ao jeito tropical, pode-se descer ao mar por uma vereda íngreme que, aqui e ali, vai sendo enfeitada com limónios. Eles sabem que a erosão costeira os levará a morar a uma cota cada vez mais baixa e, prudentemente, começam a adaptar-se ao seu futuro habitat.


Fonte da Areia, ilha do Porto Santo

1 comentário :

ZG disse...

Mais um post verdadeiramente extraordinário!!! Dá vontade de visitar o Porto Santo!!