Nem Coimbra, nem Mondego
Lotus conimbricensis Brot.
![](https://s5.postimg.cc/a42qzs0pz/Lotus-conimbricensis-03.jpg)
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Apesar dos incentivos, fiscais ou de outro teor, que alguns garantem existir, nunca como hoje se produziram em Portugal tão poucos bebés. Na expectativa de que a situação se altere, têm surgido novos e gigantescos hospitais pediátricos e centros materno-infantis, autênticos hotéis de cinco estrelas em que qualquer mãe gostaria de se hospedar, e em que qualquer bebé gostaria de vir ao mundo. Também têm, é verdade, encerrado serviços hospitalares e maternidades no interior do país, mas as atenções, cuidados e até luxos como aqueles que a medicina e a construção civil modernas podem proporcionar exigem que os nascimentos se concentrem nas principais cidades do litoral. Já lá vai o tempo em que era possível nascer em Santo Tirso, Vimioso ou Salvaterra de Magos. Agora nasce-se, se é que se quer nascer, em Coimbra, Porto ou Lisboa.
Não é certamente por culpa do Hospital Pediátrico de Coimbra, inaugurado em Fevereiro de 2011, que o grande botânico português Félix Brotero (1744–1828), se vivesse hoje, dificilmente reencontraria este Lotus em Coimbra. A Quinta das Sete Fontes, local onde originalmente Brotero colheu o Lotus conimbricensis, nome com que baptizou o achado no vol. 2 (de 1805) da sua Flora Lusitanica, foi sendo amputada com o crescimento urbano da cidade e, em meados do século passado, ficou reduzida a muito pouco com a construção do Hospital da Universidade de Coimbra. O novo Hospital Pediátrico foi apenas o derradeiro prego no caixão. Da antiga quinta sobram a casa, a capela e pouco mais, mas em Maio de 2000 a então proprietária pediu a classificação do conjunto ao antigo IPPAR. Mais de 14 anos depois, somos informados na página da Direcção-Geral do Património Cultural que a Casa das Sete Fontes (incluindo capela, edifícios anexos e mata) está desde 2007 em "vias de classificação", o que é uma espécie de pena suspensa sem fim à vista. Poderia pensar-se que o atraso na classificação e a indefinição de uma zona de protecção foram uma ajuda para que a construção do Hospital Pediátrico e dos seus acessos não sofresse percalços. A história, porém, é um pouco mais complicada. Os percalços de facto existiram, em parte porque as sete fontes insistiam em deitar água, mas a maior discórida, envolvendo IPPAR, Câmara de Coimbra e proprietários em cerrada disputa judicial, centrou-se na tentativa de demolição de uns velhos anexos agrícolas. Tenham eles permanecido de pé ou não, o certo é que, somando-se ao hospital, um novo prédio de habitação acabou por comer mais uma fatia do arvoredo.
Enfim, uma história como tantas outras do urbanismo nacional, a que o Lotus conimbricensis, que há muito terá abandonado a cidade do Mondego em busca de lugares mais propícios, é de todo indiferente. Esta planta anual de prados húmidos, cuja área de distribuição abrange o sul da Europa e o norte de África, e que em Portugal surge em quase todo o continente mas de modo muito esporádico, singulariza-se pela cor branca das suas flores, quando a maioria das suas congéneres dá flores amarelas. Outra particularidade já assinalada por Brotero é que cada pedúnculo sustenta apenas uma flor. Quanto a medidas, a planta é pouco avantajada: as hastes não têm mais que 20 a 30 cm de altura, e as flores, quase sempre em escasso número, ficam-se pelos 7 mm de diâmetro.
O único exemplar que encontrámos vivia no concelho de Vimioso, lugar onde as flores, ao contrário dos bebés, ainda têm permissão para nascer.
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Freixos (Fraxinus angustifolia) em Campo de Víboras, perto do rio Maçãs
2 comentários :
Engraçado, na nossa terra, há umas dezenas de anos, essa plnta também surgia aqui e ali. Não voltei a vê-la. Mas também é certo que a não procurei. Desconhecia que fosse natural da cidade dos estudantes; ou que, pelo menos, a urbe lhe desse nome.
A propósito da Quinta das Sete Fontes, recebemos do Sr. António José de Meneses Moreira da Fonseca um importante depoimento, que passamos a transcrever:
Minha mulher Maria José Soares de Albergaria Moreira da Fonseca é a proprietária da casa da Sete Fontes Anexos e Mata classificadas pelo IGESPAR. Aconteceu que uns anexos (cavalariças e pátio de baixo) e o "fundo da mata", por vicissitudes ocorridas ainda no tempo de sua avó Leopoldina Lima Côrte-Real, foram parar em 1993 às mãos da Imobiliária Patrocínio Tavares.
Esta Imobiliária conseguiu um alvará da CMC a autorizar a demolição desses anexos classificados, com o argumento de que se encontravam em ruína. A Direcção Regional de Cultura do Centro deu o seu aval à demolição. Demolição essa que, logo que foi iniciada, motivou a interposição, por minha mulher, de uma providência cautelar no Tribunal Administrativo de Coimbra que até hoje impediu que esta demolição fosse concluida.
Apesar de a demolição ser absolutamente ilegal, a juiza do o tribunal de 1º instância de Coimbra autorizou a demolição e apenas em recurso para o Tribunal Administrativo do Norte (Relação) este deferiu o pedido, impedindo a demolição. A acção principal continua para a anulação do Alvará de demolição já há anos expirado !!
Logo que a imobiliária comprou o fundo da mata (junto à circular interna) de imediato cortou com motoserra todas a árvores (incluindo dois cedros do líbano).
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