17/01/2017

Madeira Fern Fest (1)


Arachniodes webbiana (A. Braun) Schelpe subsp. webbiana


Férias na última semana do ano por imposição da entidade patronal, entre as luzes dos presépios gigantes, a música melosa embalando ruas e centros comerciais, a promessa de multicoloridos fogos de artifício ao último toque da meia-noite. A Madeira não é o melhor lugar para fugirmos ao espírito da quadra, até porque nos calhou ficarmos hospedados na vila com a maior concentração de presépios do mundo ocidental, mas o clima subtropical proporcionou-nos, mesmo em Dezembro, algumas gratificantes descobertas botânicas. Cabe aqui um tímido protesto por a flora madeirense não ter tirado, a nosso ver, o máximo proveito da amenidade do clima. Vigora ainda um temeroso respeito pela divisão clássica do ano em quatro estações que, com propriedade, só se aplica a latitudes mais agrestes. Não se vislumbra motivo razoável para a opção assumida pela maioria das plantas da ilha de florir naqueles meses que, no continente, chamamos de Primavera. Há flores na Madeira em Dezembro, mas não tantas como seria possível ou desejável. Para compormos o ramalhete de novidades, viramo-nos para os fetos, essas plantas austeras, avessas a enfeites, que se mantêm todo o ano iguais a si próprias.

O primeiro feto a comparecer, de seu nome Arachniodes webbiana, é um habitante da mítica laurissilva que reveste as abruptas encostas da metade norte da Madeira. Este feto de grandes folhas, que podem atingir um metro de comprimento, vive em florestas húmidas e permanentemente ensombradas. O formato pentagonal da folha, com as duas pinas basais muito maiores e mais divididas do que as restantes, pode fazer lembrar o feto-do-cabelinho (Culcita macrocarpa). Este último, contudo, é de maior envergadura (quase 2 metros) e apresenta soros marginais (ver foto), enquanto que no feto madeirense os soros estão distribuídos pela face inferior das pínulas (2.ª foto acima).

No desenho minucioso das suas frondes, a Arachniodes webbiana faz inteira justiça à teia de aranha que o seu nome invoca. Para melhor exibir tão elegante simetria, a estipe, com uns 50 cm de altura, é vertical, fazendo um ângulo quase recto com a lâmina da folha, que adopta a posição horizontal. É quase inexplicável que um feto de tão óbvias qualidades ornamentais não seja cultivado em jardins.

Apesar da abundância de habitats propícios, a Arachniodes webbiana aparece apenas em raros lugares da laurissilva, aproveitando então para formar populações numerosas. Endémica da ilha da Madeira, a raridade torna-a ainda mais vulnerável e preciosa, mas noutras eras ela ou os seus antepassados próximos terão tido uma distribuição bastante mais ampla. De facto, uma sua irmã gémea (Arachniodes foliosa, ou Arachniodes webbiana subsp. foliosa) sobrevive no sudeste de África, numa faixa que vai desde o Uganda e o Quénia até à África do Sul. As duas espécies (ou subespécies), mal se distinguindo na morfologia, são geneticamente distintas, já que a madeirense é diplóide e a africana é tetraplóide. Isso sugere que a estirpe insular é a mais antiga das duas, e sublinha o estatuto único da laurissilva madeirense, refúgio de tantas relíquias do passado da Terra.

1 comentário :

bea disse...

Também não entendo por que não cultivam essa espécie de feto em jardins; são muito ornamentais . E, de acordo com o que li, muito antigos na ilha. Portanto com estirpe. Nobres, quero dizer. Uns senhores fetos.