A prímula mais alta
As convulsões que têm afligido Espanha, ameaçando a sua integridade, são o resultado inevitável das más partilhas feitas pelos primeiros reis ibéricos. Na senda da deriva independentista da Catalunha, veio há semanas a público uma proposta do parlamento andaluz de se criar uma Grande Andaluzia, agregando-se à província com esse nome os demais «países andaluzes»: Múrcia, Algarve e Alentejo. Portugal não deve ficar mudo e quedo face a estas pulsões expansionistas que ameaçam reduzi-lo e retalhá-lo. Sim, deve afirmar desde já a vontade firme de anexar a Andaluzia — ou, em versão diplomática, a calorosa disposição de acolher a Andaluzia e as suas gentes, se elas enveradarem por uma trajectória secessionista face a Madrid. Mas não deve ficar por aqui. Que a Galiza não faça parte de Portugal é um erro crasso denunciado há muitos séculos por patriotas portugueses e galegos. Este é o momento de agir: Portugal cumpre o seu destino histórico e, ao mesmo tempo, remedeia a sua vergonhosa penúria em espécies do género Primula.
Os números são de uma triste eloquência: temos uma única espécie, Primula acaulis, quando, sem contar híbridos nem subespécies, em Espanha há oito, na Europa 33, e na China e Himalaias mais de 300. Unindo-nos à Galiza passaríamos a ter três. Sem ser bom, ajudaria a atenuar a injustiça. A mais alta das prímulas (é isso que garante, com algum exagero, o epíteto específico), Primula elatior, faria parte do enxoval, acompanhada pela Primula veris (se o seu latim anda tremido, saiba que aquele veris não significa que esta prímula seja mais verdadeira que as outras, mas sim que floresce na Primavera, como aliás fazem quase todas). Ficaríamos ainda privados desta jóia, mas ganharíamos alento para novas conquistas.
A P. elatior, que encontrámos nas Astúrias e na Cantábria, é mais frequente no norte de Espanha, ao longo dos Pirenéus e da cordilheira cantábrica; no resto da Península, só aparece na serra Nevada e, muito esporadicamente, em algumas serras do Sistema Central ibérico (Gredos e Guadarrama). As suas flores são pálidas como as da P. acaulis e surgem agrupadas na extremidade de hastes erectas como na P. veris; as suas folhas muito rugosas, reunidas em roseta basal, são também uma média entre as folhas das duas outras espécies. É natural que se levante a suspeita: será a P. elatior, não uma verdadeira espécie, mas um híbrido da P. verna com a P. acaulis? A resposta é negativa, pois o híbrido entre as duas ocorre naturalmente, acompanhado pelos seus progenitores, em grande parte da Europa; e, como podemos confirmar nesta página, não tem a cara da P. elatior, embora faça lembrar. As flores são mais pequenas, exibem manchas escuras na base das pétalas, e não estão todas viradas para o mesmo lado como sucede na P. elatior; além disso, os cálices são claramente diferentes (compare com a 3.ª foto acima) e as hastes florais mais curtas.