Samacalo arouquense
Uma consulta rápida ao segundo volume da Nova Flora de Portugal, de João do Amaral Franco, indica que o género Anarrhinum é, por cá, fácil de arrumar; e, para tarefas simples, cá estamos nós. Há apenas três espécies em Portugal:
1. Uma de distribuição europeia (A. bellidifolium (L.) Willd.), amplamente disseminada e com populações em geral numerosas — que, por esquecimento ou tendência indesculpável para dar prioridade às raridades, nunca aqui mostrámos.
2. Um endemismo do noroeste da Península Ibérica (A. duriminium (Brot.) Pers.), peludinho e de flores brancas, que, como refere o epíteto específico, habita terras inter Durium et Minium.
3. E, finalmente, um endemismo português (Anarrhinum longipedicellatum R.Fern.), descrito em 1959 pela botânica portuguesa Rosette Batarda Fernandes. Ao contrário das duas espécies anteriores, esta é uma raridade, com presença confirmada apenas em dois núcleos no centro do país, nas bacias dos rios Paiva e Vouga.
Com a desmatação e intensa reflorestação com eucaliptos, o inferno dos incêndios, o uso de agro-químicos e a limpeza excessiva, ou com herbicidas, das bermas de estrada, esta é mais uma planta cuja ecologia a pode condenar. Aprecia zonas rochosas e taludes, de solo xistoso e seco, com boa exposição solar, partilhando o habitat com o A. bellidifolium, e por vezes hibridando com ele. As populações que vimos, em Arouca e Castelo de Paiva, pareceram-nos, porém, em franca expansão, com centenas ou milhares de plantas altaneiras em escarpas consolidadas à beira de estradas que, afortunadamente, a crise não permitirá alargar nos próximos anos.
Precisamente por causa da convivência entre as duas espécies de Anarrhinum, foi essencial procurar a planta das fotos no fim da Primavera, quando floresce. É que são ambas glabras, com flores azuis, uma roseta basal de folhas lanceoladas de margens serradas, além de folhas caulinares menores, palmadas mas profundamente divididas em segmentos lineares com ápice agudo. É pelas flores que o A. bellidifolium se distingue do A. longipedicellatum: neste último, as flores são algo maiores e têm um pedicelo longo, de tal modo que a haste floral (de cor púrpura) parece um fio onde as flores se penduraram ao sol.