Lírio de espadas
Aprendi com as primaveras / a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira. Cecília Meireles, Desenho (Mar Absoluto e Outros Poemas, 1945)
Tem chovido, é certo, às vezes com a violência de um castigo, e ouvem-se discursos que nos indignam, mas há a feira a sugerir leituras e as herbáceas que irrompem do verde carregadas de flores. Tudo para uma glória efémera, por fidelidade à semente, mas é agradável confirmar que a terra não se esqueceu de que Maio é o mês dos lírios.
Este foi avistado perto de Alcanena num mato baixo que ardeu recentemente. Valeu-lhe ser planta vivaz que se salvaguarda num bolbo robusto e arrojados bolbilhos. Além de um punhado de folhas glaucas, finas e caneladas, tem uma haste elegante de uns 60 cm de altura (muito mais alta que a do Gynandriris sisyrinchium), mais longa que as folhas, no topo da qual se arvora uma flor solitária. Com uns 10 cm de diâmetro, cada flor tem segmentos internos azuis e uma mancha amarela quase até ao bordo das tépalas externas (o Maio-pequeno tem outra, mas branca). O porte da haste floral, que a primeira foto regista, justifica o epíteto xiphium, nome que deriva do grego xiphos, espada (ou, melhor, florete).
É uma espécie rupícula, de montanha, que já terá sido frequente em prados, lugares sombrios arenosos, sítios pedregosos e pousios na Península Ibérica – de onde, dizem, esta espécie é originária — e noutros países do sudoeste da Europa. Em Portugal ocorre em quase todo o centro e sul. É conhecida entre os horticultores como Spanish Iris, talvez para se distinguir dos inúmeros híbridos de jardim que se vendem como Dutch Iris — negócio que, denuncie-se, levou ao corte insensato de flores e à colheita desregrada de sementes.
Aguardamos o veredicto da Flora Ibérica sobre a família Iridaceae para sabermos se prevalece a opinião de Amaral Franco et al. segundo a qual este lírio (que, na Nova Flora de Portugal, se designa Iris xiphium var. xiphium) admite uma variedade de flores totalmente amarelas (o Iris xiphium var. lusitanica (Ker-Gawler) Franco) ou se, como defendem outros botânicos, a versão amarela constitui uma espécie autónoma, endemismo ibérico raro, o Iris lusitanica Ker Gawl. O leitor poderá deixar aqui o seu parecer na sexta-feira, quando mostrarmos a planta.