06/05/2011

Como as irlandesas

Neotinea maculata (Desf.) Stearn
Até há pouco tempo, o género Neotinea referia-se a apenas uma espécie, a N. maculata. Estudos recentes trouxeram à sua companhia mais cinco espécies do género Orchis (incluindo a famosa O. ustulata), que têm um ciclo anual semelhante. A N. maculata distribui-se pela região mediterrânica e atlântica, incluindo as ilhas Canárias e a Madeira, mas é uma espécie de hábitos mediterrânicos, adaptada a invernos amenos seguidos de verões quentes e secos. Por isso, alguns estranham que existam populações na Irlanda, de clima oceânico e muito chuvoso. Mérito do vento, talvez, e do tamanho diminuto das sementes, cerca de 1400 por cada cápsula.

A inflorescência nesta espécie tem 15 a 20 flores pequeninas que lembram homenzinhos com capacetes de tamanho desproporcionado a apontar numa mesma direcção. O labelo é trilobado, em posição ligeiramente levantada: o lóbulo central é uma fita com entalhes na margem, os laterais parecem bracinhos minúsculos e estreitos. O esporão é curto mas contém néctar, e a flor rescende levemente a baunilha. Opta frequentemente pela auto-polinização, por vezes mesmo antes de as flores desabrocharem, formando colónias de plantas idênticas; mas há registo de polinização por insectos de muito pequeno porte e ainda de reprodução vegetativa.

Por cá, a N. maculata é relativamente comum. Já a vimos em lugares soalheiros com solo calcário e arenoso, mas também em bosques sombrios, na base de carvalhos, ou em pastos de substrato ácido. Na variedade típica, as flores são cor-de-rosa e as folhas – que nascem em Outubro e se mantêm à superfície durante o Inverno – têm linhas paralelas de pintas que também podem ocorrer na haste, nas brácteas e no ovário, justificando amplamente o epíteto específico. Na variedade alba, que é rara por cá mas a mais frequente na Irlanda, as sépalas (que formam o capuz que esconde as pétalas esverdeadas) são pálidas, de cor creme com matizes verdes, e as folhas não são manchadas. Está também listada a variedade luteola, com flores amarelas, mas é muito rara e, dizem, está extinta na Irlanda.

O nome do género é fonte de controvérsia. Para alguns, deriva do grego neo (novo) e de tinea, em homenagem ao botânico siciliano Vicenzo Tineo (1791-1856). Outros sugerem explicação mais requintada e inverosímil: tinea aludiria à semelhança com as ervas africanas do género Tinnea, assim chamadas para render preito à exploradora holandesa Henrietta Tinne e às suas filhas.

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