Linho das fadas
A povoação de Ribadelago, na província de Zamora, é pequena e sossegada. São poucas as casas, aninhadas nas margens do rio Tera, mas há inúmeros percursos para os visitantes explorarem o vale pedregoso do rio, o Parque Natural do lago de Sanábria e as serras de Segundera e de Cabrera que o circundam. À entrada da povoação, porém, está uma estátua tenebrosa que nos detém: representa uma mulher no topo de um pedregulho, com roupa pesada de Inverno e um lenço a encobrir-lhe as feições, que olha perplexa para a paisagem enquanto segura bem apertada uma criança assustada ao colo. Está ali como uma homenagem, mas também como uma lição.
Depois de vários dias de chuva copiosa no início do ano de 1959, o dique de contenção da barragem hidroeléctrica de Vega de Tera, no Salto de Moncabril, rebentou na madrugada de 9 de Janeiro. Os sobreviventes aterrorizados falaram de um enorme estrondo a meio do sono, de sentirem a terra tremer sob os pés aflitos e de ouvirem um murmúrio cada vez mais próximo e ameaçador. Nesses minutos de expectativa, com a população paralisada pelo susto, o caudal do rio Tera desceu o canhão ganhando velocidade, e um muro alto e impetuoso de água atingiu de chofre a aldeia. A enxurrada levou consigo casas, gado, árvores e gente, até os sepultar no fundo do lago de Sanábria. Do próspero futuro prometido pelos promotores da barragem, responsáveis pela construção defeituosa do dique, restaram vítimas, ruínas e um chão desolador que, soterrado por toneladas de lodo, demorou anos a ter de novo serventia.
Quase setenta anos depois, o rio junto à aldeia reconstruída é manso e a vegetação recuperou inteiramente da catástrofe. E foi num dos caminhos empedrados que segue o curso do rio que vimos, no final de Junho, este linho de flores brancas.
Esta é uma herbácea anual de pequeno tamanho (os talos dos exemplares das fotos não tinham mais de 25 cm de altura) e pouco ramificada, difícil de detectar se não estiver em flor. As flores são pequeninas, não ultrapassando os 5 mm de diâmetro, mas exibem um centro amarelo bastante atraente. Esta espécie aprecia lameiros húmidos, orlas de bosque e fissuras de rochas na proximidade de riachos. Distingue-se das restantes espécies de Linum que ocorrem na Península Ibérica por ter quase todas as folhas opostas, e das restantes espécies conhecidas em Portugal por ter as pétalas brancas (em Espanha há outras duas com flores desta cor, o L. suffruticosum e o L. tenuifolium). Do Linum catharticum conhecem-se vários núcleos no nordeste de Trás-os-Montes, e há um registo recente da sua presença na serra do Gerês.
1 comentário :
Que maravilha!!
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