11/01/2014

Os três espinhos de Brotero


Genista triacanthos Brot.


As rochas de Montedor, que preenchem 1 Km da faixa costeira no concelho de Viana, são o nosso poiso favorito em todo o litoral minhoto. Há areais antes e depois, mas ali os veraneantes não encontram lugar macio onde estender as toalhas. As enormes rochas são varridas por ondas que por estes dias nem sequer respeitam os pescadores à linha. Nos interstícios mais a salvo dos salpicos das ondas desponta toda a vegetação característica das falésias costeiras, condimentada por algumas especialidades: armérias (Armeria pubigera), funcho-marítimo (Crithmum maritimum), Silene uniflora, Cochlearia danica, Romulea clusiana, Asplenium marinum e Ophioglossum lusitanicum. O feto-dos-carvalhos (Davallia canariensis) liberta-se da árvore que lhe ná nome e poleiro para descer intrepidamente até ao mar, e aqui e ali despontam as flores cor-de-rosa de um raro centáureo (Centaurium portensis). Mas a maior singularidade de Montedor é o denso mato rasteiro de tojo e urze que reveste a suave encosta entre as falésias e o pinhal. É como se alguma inexplicável deslocação da crosta terrestre tivesse arrastado um pedaço das montanhas do norte para a beira-mar. Com essa migração, os festivos amarelo e roxo da floração primaveril têm uma oportunidade única de contracenar com o azul marinho, a diversidade vegetal sai enriquecida com o encontro de dois mundos, e as daninhas acácias que dominam outros ponto da costa têm fraca oportunidade de se expandir enquanto a manta de tojo se mantiver com poucos rasgões.

O tojo (género Ulex) não é planta que se deixe gostar à primeira, muitas vezes nem à enésima, mas em Montedor ele está indiscutivelmente no local certo. Se soubermos que, embora sempre espinhentos, há muitos e diferentes tojos, já lhes começamos a achar alguma graça. E aqui, com o mar à vista, acabamos por detectar, à mistura com o tojo normal, um outro «tojo» glabro, de flores mais pequenas e mais intensamente amarelas, com espinhos menos agressivos. Averiguado o caso, concluímos que não se trata propriamente de um tojo, mas sim de uma Genista, um género botânico diversificado que inclui plantas com muitos, poucos ou nenhuns espinhos. A Genista triacanthos (a que o povo, pouco dado a subtilezas botânicas, chama tojo-gatanho ou tojo-molar, nomes que também dá a certas espécies de Ulex) é, entre elas, das mais aculeadas, destacando-se pelos espinhos trifurcados (ver 3.ª foto) que justificam o epíteto escolhido por Brotero. Dignas de nota são ainda as folhas algo carnudas, formadas por 1 a 5 folíolos curtos e estreitos (uns 6 mm de comprimento por 1 ou 2 de largura). Nos verdadeiros tojos (género Ulex) não existem folhas reconhecíveis como tal, mas apenas filódios, que são mais espinhos a juntar aos muitos que a planta já tem.

A nortada que tantas vezes estraga os planos aos veraneantes também não deixa estes arbustos no litoral erguer muito a cabeça. Em Montedor a G. triacanthos não ultrapassará o joelho de um adulto, mas noutros pontos da sua distribuição pode chegar aos 2 metros de altura. Este quase endemismo ibérico, que fora da Península só surge do outro lado do estreito de Gibraltar, no norte de Marrocos, prefere substratos ácidos e, no nosso país, onde está assinalado em todas as províncias, é assíduo frequentador de urzais-tojais a maior ou menor altitude, aparecendo também no sub-bosque de carvalhais, sobreirais e outras matas de folhosas.


Montedor, Viana do Castelo

2 comentários :

bea disse...

Verdade, é difícil gostar do tojo. Mas florido fica - aos olhos - muito igual às outras plantas, todo cromático.
Bonito mesmo deve ser Montedor e seu estar de campo e praia. Natureza à solta, diria eu.

Anónimo disse...

Lugares perenes e agrestes, ainda bem que se conservam e falais neles.
Havia, pela Gelfa adiante, um sítio encantador: o forte do Cão. Onde as pedras pareciam atiradas por gigantes e uma casa enorme (de loucos? me disseram) consumia os olhos-janelas na paisagem impossível.
Deve ter vivendolas...
Hei-de lá ir verificar.
Abç da bettips