08/02/2014

Chá do monte


Acinos alpinus (L.) Moench


Um passeio despreocupado pelo campo deixa-nos a impressão de que quase todas as nossas flores silvestres são amarelas ou azuis, ainda que por vezes se deixem pintalgar de outras cores ou assumam tons alaranjados, púrpura ou roxos. Há excepções, claro, o branco ou o vermelho também se usam, mas o amarelo e o azul parecem ser preferidos pelos polinizadores e são, por isso, dominantes. O que faz então cada planta para que as suas flores, que pela cor não se notabilizam entre as demais, sobressaiam no manto amarelo-azul? Investe em detalhes: manchas, descolorações ou desenhos junto de estames ou estigmas, que sugerem a presença de abundante néctar; o contraste entre matizes de azul ou amarelo, por vezes misturados com outras cores, que apontam o local exacto onde a aproximação da abelha à flor deve acontecer; e um sítio confortável e amplo para os polinizadores aterrarem, por vezes com uma penugem para amaciar a manobra (e entretanto facilitar o carregamento/descarregamento do pólen).

A planta das fotos, de talos ramificados na base, por vezes lenhosos, e aromáticos, serve-se de todos estes cuidados e junta-lhes mais três. As flores aparecem em andares, entremeados por folhas/brácteas, e um tal arranjo em espiga, como um grande centro comercial, atrai mais polinizadores. Além disso, o lóbulo superior das corolas (que nascem no Verão) é um capuz que protege de um sol abrasador ou garante abrigo num dia de Julho chuvoso. E, em anos em que isso lhes pareça conveniente, algumas plantas de cada população só dão flores femininas, pequeninas mas em maior quantidade, assegurando desse modo uma mais abundante produção de sementes.

Este é um género da Europa e Norte de África de que na Península Ibérica ocorrem três espécies. Por cá só se conhece a A. alpinus, que é perene mas pouco comum: os registos dão conta da sua presença apenas na Beira Alta (onde a vimos, num souto na serra da Estrela onde também há uma população de orquídeas raras), na Beira Baixa e em Trás-os-Montes (na região de Bragança). Agradam-lhe clareiras de matos baixos ou orlas de bosques, solo pedregoso e altitudes entre os 500 e os 1900 metros.

4 comentários :

ZG disse...

Bela planta e bem rara! E a Epipactis fageticola deve ser ainda mais rara! Terá aparecido na zona de Carril de Famalicão ou do Chafariz do Bispo, na descida da estrada para a Guarda, pouco antes de aparecer a Crupina?

Carlos M. Silva disse...

Olá

Foi a diligência do Alexandre/CISE em ir parando (mandando parar o autocarro) em algumas bermas nas estradas da serra que sim, me permitiu conhecer esta num pequeno socalco, nem sequer lameiro, junto a uma dessas paragens. Ele tem o mapa da Estrela na cabeça e eu, leigo, agradeço, naturalmente.
Abraço para vós.

Carlos M. Silva

Maria Carvalho disse...

Caro ZG: Vimo-la no Souto do Concelho, junto a um ribeiro. A população de Epipactis fageticola está perto, numa zona sombria, bem irrigada e de solo turfoso.

Olá, Carlos. Esta planta é mais bonita ao vivo, tem um porte realmente elegante. E, sim, a serra é (a casa) do Alexandre.

bettips disse...

Nem de outra beleza azul precisaria para o chá das 5! Sempre florestando, percebemos que o "mato" acima é apenas um pretexto para as limpezas que ninguém faz ou faz mal.
Abçs