23/08/2020

Melancias de bolso


Bryonia verrucosa Dryand.


Melancias, melões e meloas fazem-nos dar graças à vida por existir o Verão. Esquecemos o calor, as queimaduras, os mosquitos, os fios de suor a escorrer pela cara, e só queremos lembrar aquele momento em que o melão gelado e doce se nos enrola na língua, deslizando depois goela abaixo para nos refrescar o âmago. Tal como a abóbora, mais associada ao Inverno, esses excelsos frutos são produzidos por plantas da família Cucurbitaceae, cultivadas pelo homem há centenas ou milhares de anos. É uma família constituída por plantas rastejantes ou trepadeiras, amiúde anuais, com flores de cinco pétalas em vários tons de amarelo, caracteristicamente lanudas ou frisadas. Além de podermos vê-las crescer nos mais modestos quintais, também há cucurbitáceas na natureza, só que dão frutos de menor tamanho, por vezes tão tóxicos que nem a medicina popular lhes quer dar uso. Sofrem desse óbice as duas únicas espécies espontâneas em Portugal continental, Ecballium elaterium e Bryonia dioica.

Os frutos da Bryonia dioica parecem tomatinhos. Em contraste, a Bryonia verrucosa, endémica das Canárias, produz perfeitas melancias em miniatura (foto em baixo), de não mais que 3 cm de diâmetro, com as faixas verde-escuras alternando com faixas claras tal como nas melancias genuínas. Claro que as aparências enganam, e nem um nem outro destes frutos miniaturais se deixam ou devem comer. Não por acaso, a Bryonia verrucosa é conhecida nas Canárias como venenillo. Além da desproporção de tamanhos, outra diferença marcante entre o venenillo e a melancia está no ciclo de vida: a Bryonia verrucosa (tal como a B. dioica) é uma planta perene, enquanto que o Citrullus lanatus (melancia) é anual.

Presente em todas as ilhas das Canárias com excepção de Fuerteventura, a Bryonia verrucosa é uma trepadeira de modesto alcance, com hastes que raramente ultrapassam os dois metros de comprimento e flores com cerca de 2 cm de largura. Vive em matos, ou ocasionalmente sobre muros velhos, em zonas de média ou baixa altitude, quase sempre abaixo dos 500 metros. A floração e frutificação decorrem de Outubro a Março, que em latitudes menos bonançosas são os meses de Outono e Inverno. O exemplar das fotos acima, que foram captadas em Dezembro do ano passado, vive numa berma de estrada na Grã-Canária, perto da reserva de Los Tilos de Moya.

1 comentário :

Unknown disse...

Este blogue é um Hino à Vida. Este blogue ensina-nos tanto de botânica, como a capacidade, rara, de escrever com poesia. Toda a escrita nele impressa é cativante. É raro num botânico. E raríssimo um poeta que se fixa na cor das plantas e não observa os detalhes de cada planta. Parabéns.