06/12/2021

Almeirante das alturas

Crepis andryaloides Lowe


Na Madeira, algumas plantas do género Crepis, que são asteráceas de hastes ramificadas com capítulos florais semelhantes aos dos dentes-de-leão (género Taraxacum), recebem o curioso nome de almeirante. Custa convencer os dicionários e os motores de busca de que aquele "e" a seguir ao "m" não é gralha; e que, em vez de querermos saber da vida e dos feitos do popularíssimo militar que comandou a epopeia das picadelas, estamos interessados em plantas que não são especialmente vistosas nem prestigiadas (e que seria de fraco gosto relacionar com tão heróica figura).

São vários os almeirantes madeirenses, todos bastante normais dentro do género a que pertencem, e alguns até considerados por vários autores como simples subespécies da Crepis vesicaria, planta vulgar em Portugal continental, onde apenas está ausente do Minho e Douro Litoral. É o caso do almeirante acima ilustrado, habitante dos picos mais elevados da cordilheira central da Madeira: descrito em 1831 como espécie autónoma por Richard T. Lowe sob o nome de Crepis andryaloides, em 1939 seria despromovido a Crepis vesicaria subsp. andryaloides pelo americano Ernest Brown Babcock. Houvesse o reverendo Lowe considerado este endemismo madeirense como subespécie, não seria surpresa se Babcock optasse por elevá-la a espécie. Antes de os estudos moleculares virem pôr alguma disciplina nestas questões, era sempre possível invocar argumentos razoáveis em favor de uma ou de outra opção — e, se a a opção A houvesse já sido defendida por um antecessor, restaria a quem quisesse publicar nova adenda sobre o assunto defender a opção B.

Tanto nas preferências ecológicas como na morfologia, as diferenças entre C. vesicaria e C. andryaloides são tão vincadas que parece uma arbitrariedade subordinar uma à outra. Em contraste com a planta continental, a planta madeirense tem as hastes muito curtas, apresenta folhas com recorte diferente e, sobretudo, tem a parte superior — em especial os invólucros florais — densamente revestida por pêlos longos e sedosos. É aliás esse aspecto hirsuto, semelhante ao que costumam exibir as espécies do género Andryala, que explica o epíteto andryaloides.

De acordo com Press & Short (em Flora of Madeira, 1994), o almeirante-das-alturas (também há, na Madeira e no Porto Santo, vários almeirantes-de-beira-mar) é uma planta que já foi frequente na ilha mas tem vindo a rarear. Tendo nós encontrado apenas dois ou três exemplares, é bem provável que tal diagnóstico seja certeiro.

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