07/09/2012

Patalugo

Leontodon rigens (Dryand.) Paiva & Ormonde Leontodon hochstetteri M. Moura & L. Silva


Há quem saia das ilhas movido por sonhos de grandeza. As plantas têm a atitude oposta e instalam-se nas ilhas para ficarem grandes. Já aqui reportámos instâncias desse fenómeno açoriano, com uma Angelica e uma Tolpis que extravasam escandalosamente as medidas aconselhadas para os géneros a que pertencem. E, embora de aparência mais comedida, pois não ultrapassa os 60 cm de altura, o Leontodon rigens, outro endemismo açoriano, faz figura de extraterrestre face a congéneres continentais como o L. tuberosus e L. taraxacoides. Além das folhas grandes (30 cm de comprimento), caracteristicamente recortadas e peludas (toda a planta é aliás bastante hirsuta), o que singulariza o L. rigens é o modo como os capítulos florais, cada um deles com 5 ou 6 cm de diâmetro, se dispõem em corimbos quase esféricos.

Patalugo-menor é o nome por que ele é conhecido no seu arquipélago natal, ficando patalugo-maior reservado para o também açoriano Leontodon filii. Paradoxalmente, o patalugo-menor excede o seu irmão em quase todos os parâmetros: no tamanho das folhas, na altura da haste floral, na abundância da floração. O patalugo-maior só se superioriza no diâmetro dos capítulos florais, mas perde por ter apenas 4 ou 5 em cada haste. Os dois Leontodon são de floração estival, ocorrendo cada um deles em cinco ilhas: ambos em São Miguel, Pico e Terceira; o L. filii ainda em São Jorge e no Faial; e o L. rigens nas Flores e no Corvo. Como sucede a quase todos os endemismos açorianos, os patalugos são raros e têm a sua sobrevivência ameaçada, com a importante ressalva de o L. rigens ser comum nas Flores, e só nas Flores. Enfeitando bermas de estrada, onde aliás só não surge com maior frequência por causa da perseguição das brigadas de limpeza, substituiria com vantagem as exóticas hortênsias como imagem de marca da ilha, pois floresce na época do ano em que chegam mais visitantes.

Terminamos com um apontamento semântico-morfológico. Leontodon significa dente de leão, nome que é costume dar, em português e em outras línguas, às plantas do género Taraxacum. Os dois géneros botânicos têm evidentes semelhanças, tanto nas inflorescências como no recorte das folhas onde a imaginação popular, acolhida por Lineu, quis ver a dentadura do grande felino. Talvez o modo mais fiável de distinguir os Taraxacum seja pelas brácteas involucrais proeminentes, por vezes com os ápices recurvados para baixo.

Nota. Um artigo de 2015 na revista Phytotaxa, intitulado A revision of the genus Leontodon (Asteraceae) in the Azores based on morphological and molecular evidence), mostrou que as plantas do grupo ocidental antes incluídas em Leontodon rigens constituem de facto uma espécie diferente, a que os autores chamaram Leontodon hochstetteri. Assim reinterpretado, L. rigens é um endemisno da ilha de São Miguel.

2 comentários :

C.C. disse...

Não poso deixar de me extasiar com as belíssimas fotografias deste blog.e com os saberes sobre plantas tão originais.
Obrigada

bettips disse...

Porque as plantas do chão
e lugares
e ilhas
EXISTEM,
do que nos dão imagem e conta.
Abçs