10/05/2013

Todos os minutus contam

Senecio minutus L.


A paisagem portuguesa tem sido moldada com o intuito de ajudar quem, como nós, procura conhecer exemplares raros da flora lusitana. Com efeito, os nichos onde algumas plantas (ainda) ocorrem — que se obedecessem a um programa de conservação sério seriam de muito difícil acesso — são, pelo contrário, servidos por estradões de piso suave, com margens severamente escavadas para que o progresso possa passar sem demora e se instalem eólicas, postes de alta tensão, antenas. Como diz a ministra do Ambiente, as vantagens deste avanço são de tal grandeza que já nem a destruição da fauna e flora por afogamento numa barragem é, nos tempos actuais, um evento irreversível. Na prática, a natureza não parece obedecer à ministra, e as espécies atingidas por tais excessos extinguem-se, tornam-se raras ou em vias de desaparecer, o que aumenta o seu interesse e nos oferece amplas oportunidades de regozijo por descobrir o que poucos conhecem. Como vêem, é uma opção ambiental que, além do mais, nos serve de bússula: onde a tecnologia pesada e destruidora se acomoda, está um habitat outrora notável pela biodiversidade; resta-nos olhar atentamente o que sobra, agora diminuto e, por isso, mais valioso.

Amaral Franco não cita esta planta na Nova Flora de Portugal, de 1984, apesar de António Xavier Pereira Coutinho ter registado correctamente, em 1913, a sua ocorrência em terrenos pedregosos e secos do Baixo Alentejo, Beira Baixa e Estremadura, e de ela também ter sido assinalada por Gonçalo Sampaio em 1947. Franco entendeu que Coutinho e Sampaio a teriam confundido com o Senecio leucanthemifolius Poir., e outras Floras disseminaram a asneira até que se confirmaram essas observações como sendo de Senecio minutus. Em 2005, Pinto-Gomes e Paiva-Ferreira encontram-na no Barrocal Algarvio e, em 2008, João D. Almeida publicou o registo de mais uma população, desta vez em Minde, em fendas de rocha calcária a uns 380 metros de altitude. No total, conhece-se pouco mais do que meia dúzia de populações desta planta em Portugal. Em Espanha, a julgar pelos registos da Anthos, é relativamente abundante. Porém, a sua distribuição global é escassa: Portugal, Espanha e Marrocos.

É uma planta delicada, frágil e pequenina, com capítulos solitários no topo de hastes relativamente longas, com 2.5 cm de diâmetro e 8 a 12 lígulas amarelas com a face inferior raiada de púrpura. As folhas basais são obovadas, levemente dentadas; as que se situam a meio da planta têm lóbulos fundos; as superiores são lineares de margens inteiras. A Flora Ibérica ainda não publicou o capítulo sobre o género Senecio. Quando isso acontecer, talvez esta herbácea mude oficialmente para o género Jacobaea, passando por isso a ser minuta.

Em 2011, por indicação de Miguel Porto e Ana Júlia Pereira, vimo-la pela primeira vez numa cascalheira da Ota, localidade onde iria nascer, em certa época, mais uma infraestrutura essencial ao país, dessa vez um aeroporto. Em Abril deste ano, descobrimos outra população, a preencher várias bolsas de terra de um afloramento calcário em Sicó, a cerca de 550 metros de altitude, parcialmente destruído por antenas de telecomunicações e por um antigo marco geodésico. Como é planta anual, para o ano esperamos conhecer-lhe a descendência.

5 comentários :

Carlos M. Silva disse...

Olá Maria

Aqui ..venho agradecer a 'vossa missão' de continuarem a darem nomes ao que,como eu, vão fotografando mas que não conseguem ir além, já em Abr/2009 na Fórnea do PNSAC e que aqui estivera com nome de planta (não mínima mas nanus!!!) mas com género que não existe cá!

Cumprimentos
Carlos M. Silva

Maria Carvalho disse...

Este Senecio distingue-se bem dos outros; o problema é encontrá-lo. A Fórnea parece um lugar adequado para ele, por lá não há antenas nem eólicas. Não nos envias fotos? E do Centaurium do forte de Paçô?

Carlos M. Silva disse...

Olá Maria.

Sim, envio.
É possível que o Senecio se distinga mas na altura (2009!) 'só tinha olhos para a flor' e quando a remeti ao Naturdata o Ian, claro que me negou o nome (que não era de cá, qq coisa B. nanus, que terei encontrado na net e que por ser mínimo, ..era esse!!; nem confrontei, na altura com o que é de cá!); mas agora ..acho que só pode ser esse. E o outro ..no Paçô, confrontei-o no Flora-On e acho ser mesmo esse! E não aquele que me identificaram na Gavieira/ao lado do Soajo!!!, que é o outro!
Envio daqui a pouco.
Abraço
Carlos M. Silva

Ian Smith disse...

Claro que Senecio minutus existe em Portugal, e vamos incluir as fotos de Carlos M Silva no Naturdata. Mas donde vem a ideia que houve uma confusão com S. leucanthemifolius? O texto de Franco é o mesmo que o da Flora europaea. Fala-se só de variantes de leucanthemifolius, sem alusão a minutus. Independentemente, nem Franco, nem Flora europaea, indicam a presença de minutus em Portugal. Este erro tem de vir dos autores da Flora europaea.
Só no indice do vol II de Franco vemos uma ligação. S. minutus se refere a pagina 428, com a anotação (12?), que sugere que o "minutus" português pode ser leucanthemifolius. Quem escreveu, e que significou? Não é claro. Sem duvida, pode ser a fonte do erro que foi repetido em outras publicações.

Paulo Araújo disse...

Sim, o contributo do Franco para a confusão foi essa entrada no índice do vol. 2. São vários os exemplos em que Franco desvaloriza os contributos dos seus antecessores Xavier Coutinho (XC) e Gonçalo Sampaio (GS). Como esses autores incluíram o S. minutus nas suas Floras, e Franco nega a existência da espécie em Portugal, remetendo antes para o S. leucanthemifolius, a única leitura possível é que Franco acha que tanto XC como GS confundiram as duas espécies. Mas, se Franco examinou material de herbário (não é certo que o tenha feito), afinal quem fez confusão foi ele.