Valéria dos montes
Valeriana montana L.
Entre as plantas mais vistosas que podemos ter no jardim sem incorrer em qualquer despesa (já que os tempos não estão para esbanjamentos e há que atender a outras prioridades) contam-se os alfinetes (Centranthus ruber). Para os vermos espreitar de cima do muro, preparando o salto para os canteiros, basta assegurar um nível razoável de desmazelo. Uma vez instalados, os cuidados de manutenção exigidos situam-se ao mesmo nível relaxante do dolce far niente. É a natureza a retomar a posse dos seus domínios, fazendo de nós espectadores encantados e agradecidos.
Um pouco de reflexão mostra porém que essa natureza que coloniza os interstícios abandonados das cidades não é mera reprodução em pequena escala daquela que vemos nos bosques e nos campos. Há plantas que gostam da nossa proximidade, que foram de facto domesticadas mesmo sem terem passado pelo comércio hortícola. São os gatos de cidade em versão vegetal: autónomas, insubmissas à nossa vontade, mas subtilmente dependentes. O Centranthus ruber é um caso paradigmático: embora faça parte oficial da nossa flora autóctone, é raríssimo encontrá-lo em espaços naturais, preferindo de longe os habitats urbanos. Outras plantas de índole vincadamente citadina são as viúvas (Trachelium caeruleum), a erva-parietária (Parietaria judaica) e a avenca (Adiantum capillus-veneris). Onde estavam todas elas antes de existirem muros, aldeias e cidades?
Se formos imparciais, temos de admitir que os alfinetes dos nossos muros são mais bonitos do que a Valeriana montana que fotografámos nos picos da Cantábria. A comparação não é descabida porque as duas pertencem à mesma família botânica, assemelhando-se na morfologia das flores, nos caules erectos e simples, e na disposição terminal das inflorescências. Daí podemos extrair, para nosso edificação, preceitos gerais sobre o gosto pelas coisas comuns e a não equivalência entre raridade e formosura.
Apesar de a Flora Ibérica noticiar a sua presença no nordeste transmontano, a valéria-dos-montes não parece ter sido vista em Portugal nas últimas décadas. Diferindo da sua congénere V. dioica pelas folhas inteiras e por não ser dióica, e também pelo hábito menos empertigado (as hastes não ultrapassam os 70 cm de altura), esta Valeriana alpina é uma planta de raízes estolhosas que floresce entre Junho e Agosto. Distribui-se pelas montanhas do centro e sul da Europa, e na Península Ibérica é mais frequente na Cordilheira Cantábrica e nos Pirenéus.
2 comentários :
Muito prazer, D. Valéria dos Montes.
Belas plantas, efectivamente, as valerianas e o Centranthus ruber também naturalmente!
Aliás o Centranthus ruber continua actualmente em floração neste tempo tão frio, assim como outras beldades resistentes, como Ehrarta erecta, Erigeron Karwinskianus, Oxalis Pes-caprae, Calamintha Nepeta, Rosmarinus officinalis, Cymbalaria muralis, Antirrhinum Linkianum, Verbascum levanticum, etc!
A avenca, as parietárias, as urtigas e os gerânios, assim como a Micromeria Juliana e o Trachelium caeruleum também continuam em boa forma, felizmente!
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