16/06/2012

Na estrada das armérias

Armeria transmontana (Samp.) G. H. M. Lawr.


Quem por estes dias percorrer as estradas do patamar intermédio da serra da Estrela — em especial as que ligam Seia ao Sabugueiro e as Penhas Douradas a Gouveia — é muitas vezes incitado a parar pelos mantos de flores cor-de-rosa que cobrem bermas e taludes. Encostar o carro à valeta por tão inebriante motivo não suscita as buzinadelas indignadas, habituais noutras ocasiões, dos condutores obrigados a desviarem-se. O normal é que eles parem, sorridentes, e se juntem à nossa contemplação. Se não as conhecerem (é raro, mas acontece), hão-de querer saber que flores são aquelas. Talvez se satisfaçam com a informação de que são armérias, e não insistam para nosso embaraço em saber qual a espécie. Quem já se debruçou pacientemente sobre o assunto diz-nos que as armérias da serra têm tendência a misturar-se e confundir-se, mas que as que vivem a média altitude são provavelmente Armeria beirana, substituídas mais acima por Armeria sampaioi. Seguramente não são A. transmontana, pois apresentam folhas bastantes mais largas e curtas. Não haveria, porém, qualquer obstáculo geográfico a que o fossem, pois a A. transmontana não é exclusiva de Trás-os-Montes, descendo pelo menos até à Guarda. E no seu território de eleição, mais a norte, também ela é capaz de formar bonitos tapetes, posto que de um rosa mais pálido.

No Alto Douro, onde as imagens foram captadas, o risco de confusão em matéria-arméria é pequeno. De acordo com a Flora da região demarcada do Douro (de António Luís Crespi, Sónia Bernardos & Adriano Sampaio e Castro), a única espécie semelhante à Armeria transmontana presente nesse território é a própria A. transmontana. Temos assim uma denominação de origem controlada, o que nos dá outra tranquilidade. Pena não termos ocasião para nos gabarmos deste conhecimento, pois no Douro pouca gente pára a contemplar a vegetação espontânea. Só se for um viticultor a calcular mentalmente de quantos litros de herbicida precisará para se livrar dela.

Se ainda hoje as armérias são complicadas, pelo costume que têm de hibridarem entre si, muito mais o eram para quem quis guiar-se pelo 2.º volume (de 1984) da Nova Flora de Portugal, de João do Amaral Franco. A Armeria transmontana foi por ele pulverizada em três subespécies, hoje no limbo dos nomes botânicos esquecidos, onde gozam da companhia da A. duriensis e de muitas outras espécies e subespécies baptizadas pelo mesmo autor.

Só havendo uma espécie sem subespécies a complicar, aqui vão alguns dados deste endemismo do noroeste da Península. A Armeria transmontana, que floresce de Maio a Junho em sítios pedregosos ou em clareiras de matos, apresenta folhas quase lineares de 10 a 15 cm de comprimento e uma haste floral que pode ultrapassar os 50 cm de altura. As flores, agrupadas em capítulos densos com cerca de 2,5 cm de diâmetro, têm corola branca ou de um rosa esbatido.

6 comentários :

Rafael Carvalho disse...

Sou um daqueles malucos que param para contemplar a vegetação espontânea duriense.
Acho a Armeria transmontana tão bela que a pantei no meu jardim, uma preocupação adicional para aqueles que já estavam preocupados comigo pelo facto de a querer contemplar na beira da estrada.
Cumprimentos.

Rafael Carvalho disse...

Já agora mostro as minhas armérias, os meus cravos-do-monte:

http://jardimautoctone.blogspot.pt/2012/05/cravo-do-monte.html

Francisco Clamote disse...

Também tenho andado por essa estrada nos últimos tempos e se as armérias são de facto muitas, no distingui-las é que está o busílis. Para mim, é claro.Saudações cordiais

Paulo Araújo disse...

Rafael:

São bonitas as suas armérias. Era muito bom que o exemplo do seu jardim fosse seguido e mais gente começasse a usar plantas autóctones em jardinagem. A usar cá, bem entendido, porque muitas destas plantas por nós desprezadas foram exportadas com sucesso para outros países.

Saudações

Paulo Araújo disse...

Francisco:

Obrigado pelo seu comentário. Também já concluí que as armérias são para tratar com cautela. Os especialistas que se entendam com elas. Mas já é muito bom nós podermos admirá-las.

Saudações cordiais

Carlos Aguiar disse...

As A. transmotana de flores rosa têm que se lhe diga. A A. transmotana típicas têm flores branca. As de flores rosa aparecem nas montanhas e no vale do Douro, não muito longe da A. beirana. A subs. pseudotransmontana que o Prof. Franco propõe para as A. transmontana de flores rosa até é capaz de fazer sentido.
Este teu post é muito fixe.