Flora endémica do Porto Santo: Echium portosanctensis
Echium portosanctensis J. A. Carvalho, Pontes, Batista-Marques & R. Jardim
Responsáveis por uma vasta mancha roxa que enfeita agora os nossos prados e terrenos baldios, as plantas do género Echium são vulgares no nosso território e resistentes a muitos dos riscos a que estão sujeitos nestes habitats. Não são especialmente bonitas, com excepção do raríssimo E. boissieri, mas em conjunto garantem uma nota colorida nos campos e são fonte importante de alimento para as abelhas.
As espécies que existem no arquipélago da Madeira destacam-se das continentais pelo porte arbustivo e pelas inflorescências cilíndricas exuberantes. Sabe-se hoje que essas espécies de Echium derivam de uma herbácea do continente europeu, conclusão fundamentada num estudo genético conduzido, em 1996, por Böhle e colaboradores. E, de facto, a um olhar desatento, as plantas de Porto Santo talvez pareçam todas iguais, e semelhantes ao endemismo madeirense E. nervosum (foto em baixo). Porém, anos antes, já havia sido notado, em obras sobre a flora da Madeira, que alguns espécimes em Porto Santo se distinguiam pela corolas branco-rosadas, com estames de cor carmim e anteras azuis, e um anel branco (que surge na 4ª foto) no topo da inflorescência, que é mais pequena que a do E. nervosum. E, decerto, também terão reparado em diferenças na forma e textura das folhas, e no tipo de pêlos que as protegem.
Foi o bastante para que uns quarenta anos depois, em 2010, alguns botânicos quisessem pôr fim às dúvidas e, após minuciosa comparação morfológica, publicassem um artigo (no Anales del Jardín Botánico de Madrid, Vol. 67 (2) : 87-96) que atesta a existência de três espécies endémicas do género Echium no arquipélago da Madeira: E. candicans, planta de montanha e de que só há registo acima dos 800 metros na ilha da Madeira; E. nervosumon, das ilhas da Madeira, Desertas e Porto Santo; e E. portosanctensis, da ilha de Porto Santo, com flores campanuladas (não em funil, como as outras espécies continentais e madeirenses) e com um matiz de azul escuro na base de cada corola (ausente nas outras espécies). Os autores estão seguros sobre o valor adaptativo de todos estes pormenores distintivos ao ambiente rochoso e, por vezes, muito seco de Porto Santo, com intenso vento e maresia. E apresentam uma chave clara para mais facilmente identificarmos cada uma das espécies.
Depois de termos visto o E. nervosum plantado em jardins e bermas de estrada em vários locais da ilha, foi o E. portosanctensis que procurámos na subida ao Pico Branco, montanha com cerca de 450 metros de altura máxima e um percurso assinalado até ao topo, protegido aqui e ali por uma balaustrada firme de madeira. A flora interessante está nas encostas mais ou menos escarpadas que ladeiam o caminho e, confirmámos, o Echium portosanctensis acompanha-nos esparsamente durante quase toda a subida. A distribuição conhecida do E. portosanctensis restringe-se a este pico e ao Pico da Gandaia, com um total de cerca de mil indivíduos. Não surpreende que conste da lista vermelha internacional de espécies em risco.
Pico Branco, ilha do Porto Santo
4 comentários :
Que belas são e que bela é a deste post.
Pena que quando por lá vivi um ano e visitei e percorri Porto Santo, não 'sabia o que era a Botânica'.Foram outras as coisas que chamaram o olhar, certamente. E como não mais voltei ..
Olhando o Echium de Porto Santo, eu nem seria capaz de o catalogar como Echium!!!
Abraço e obrigado por mostrarem o que há mais de 20 anos não cheguei a ver.
Carlos
Com elevado interesse geológico, a última foto, exibindo magnificamente a disjunção prismática do basalto, é tão importante e pedagógica como o são, a outro nível, os endemismos botânicos da Madeira e do Porto Santo.
Em Portugal continental, este fenómeno geológico da disjunção prismática do basalto ocorre no penedo do Lexim, nas proximidades de Mafra. Embora restrito e de dimensão relativamente pequena, trata-se de um geomonumento a preservar (e mostrar) tal como o de Porto Santo, mais espectacular, porque em maior escala.
Belas fotos, como é comum no "Dias com árvores". Parabéns.
Uma ilha realmente fascinante!!
Prazer em conhecer a espécie com inflorescência tão garrida.
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