17/07/2019

O que o Teide tem



A maioria de nós teria decerto dificuldade em viver alguns meses ao relento sob intenso frio e neve (algo que os esquimós conseguem fazer assobiando), aguentando logo depois, e durante o resto do ano, um calor implacável e uma secura extrema (que não atrapalham quem vive junto ao Equador, a saltitar entre riachos e cachoeiras). É a mudança repentina de um regime para outro que não parece ser uma experiência inscrita nos nossos genes, para a qual tenhamos adquirido um meio rápido de adaptação. Pelo contrário, há plantas que resolveram esse problema climático, apesar da sua inexorável imobilidade, permitindo-lhe sobreviver em paragens assim hostis. E algumas até têm um aspecto bastante frágil. Ora veja.



Descurainia bourgeauana (E. Fourn.) O. E. Schulz



Nepeta teydea Webb & Berthel.


No topo da Montanha Branca, no Parque Nacional do Teide, em Tenerife, o que nos rodeia é um mar silencioso de areia cor-de-argila cuja claridade agride os olhos e, já em Maio, é insuportavelmente quente. Mas, entre pausas e muitos goles de água, conseguimos reparar que há afinal plantas tenazes que aqui vivem, e em alguns padrões curiosos: a maioria das plantas hiberna no Inverno, e a floração é curta; a ramagem nova dos raros arbustos (giestas ou retamas) forma uns almofadões densos mas rasteiros; outras plantas têm raízes longas e ondulantes que espreitam entre os torrões secos; outras apresentam folhas pequenas, cobertas de penugem, em compactos arranjos basais; e é frequente a opção de não se desfazerem das partes secas, sejam elas ramos ou cápsulas de frutos já vazias, que se inclinam para o centro da planta e aí despejam toda a água que conseguem captar. Obviamente, estes estratagemas servem para proteger as plantas de ventos fortes (como os que sopram nos desertos e que no cume do Teide são assíduos) e da elevada radiação solar, ao mesmo tempo que lhes permitem reter a humidade do ar, reduzir a perda de água por transpiração e assegurar alguma ração de água.

Terá sido um processo gradual de colonização, com sucessos e recuos. A paisagem vegetal do Teide oferece ocasião, como as ilhas Galápagos noutro século, para uma aventurosa lição (até em férias) sobre a evolução da natureza em circunstâncias adversas.

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