O outro gerânio da Madeira
Geranium palmatum Cav.
O gerânio-da-Madeira (Geranium maderense), talvez o mais famoso embaixador da flora madeirense, conquistou lugar de honra em jardins de clima temperado por todo o mundo com a sua impressionante floração rosada em forma de cogumelo gigante. Contudo, mesmo na Madeira é muito mais fácil encontrá-lo em jardins do que em habitat natural. Se ainda existirem na Madeira populações espontâneas deste gerânio, elas estão bem escondidas, e os exemplares que ocasionalmente se vêem em levadas ou junto a casas florestais são em geral cultivados. Assim, e porque o nosso código de conduta nos impõe cingirmo-nos àquilo que a natureza de sua livre vontade nos dá a contemplar, viramo-nos para outro gerânio de porte respeitável, também ele endémico da Madeira.
Não podemos dizer, sem arriscar a credibilidade, que o Geranium palmatum é tão vistoso e atraente como o G. maderense, mas a verdade é que no mundo inteiro não há outro gerânio que não saísse desfavorecido da comparação. E o G. palmatum, além de ser digno representante do seu género, ainda nos oferece pistas sobre a linhagem de gerânios que colonizou a Madeira e as Canárias. Os gerânios endémicos dessas ilhas (três espécies na Madeira e uma nas Canárias) têm entre si óbvios laços de parentesco, parecendo descender, todos eles, do Geranium robertianum (erva-de-São-Roberto) ou do G. purpureum, duas herbáces anuais comuns na Europa (e em Portugal) que se julga serem também nativas das ilhas atlânticas. Assim, tendo aportado às ilhas por sementes vindas do continente, as plantas colonizadoras terão aí evoluído para novas espécies, mas sem deixarem de manter redutos populacionais com características morfológicas e genéticas idênticas às das plantas pioneiras. Uma hipótese que mais facilmente explica este comportamento dúplice é que tenha havido hibridação entre o G. robertianum (ou o G. purpureum) e outras espécies entretanto já desaparecidas das ilhas.
Ainda que exiba folhagem com recorte semelhante à do G. robertianum, o G. palmatum é uma planta de muito maior envergadura que chega a formar um curto caule lenhoso, e tanto as suas folhas como as suas flores são consideravelmente maiores do que as do seu congénere. A coloração das flores é também distinta: as do G. palmatum são uniformemente rosadas (ou púrpuras), enquanto que no G. robertianum a base das pétalas é esbranquiçada (foto aqui). A mesma diferença pode ser apontada entre o G. palmatum e o G. reuteri, endémico das canárias, distinguindo-se ainda este último pelos estames muito mais compridos e salientes. De resto, os dois gerânios insulares assemelham-se a tal ponto, tanto no aspecto geral como nas preferências ecológicas (ambos buscam lugares umbrosos e frescos), que fazem figura de um par de gémeos. O que, atendendo à provável progenitura de ambos, não anda longe da verdade.
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