Uma questão de saias
Há uns anos, na revista de domingo do jornal Público, pudemos ler um artigo sobre Paredes de Coura e os seus inúmeros atractivos. Além da paisagem e da gastronomia de raiz minhota, com vários arrozes, a lampreia e o famoso leite-creme, falava-se também de uma planta, o Narcissus cyclamineus, de flores de um amarelo peculiar e de trombeta longa, que coloriria em Abril as margens do rio Coura. Talvez animados por reportagens como esta, alguns sócios da Daffodil Society, que só conheciam as variedades criadas em hortos, resolveram procurar populações silvestres deste narciso. Começaram por visitar a Galiza — onde não avistaram nem um para amostra. Seguiram esperançados para o Minho, mas não encontraram quaisquer indícios das pequenas flores amarelas a cabecear. Decepcionados, voltaram para Inglaterra convencidos de que o Narcissus cyclamineus estaria extinto na natureza.
Como sabem, este narciso é um endemismo do noroeste da Península Ibérica que, embora protegido por lei, está ameaçado pela degradação dos cursos de água e prados vizinhos; mas ainda não está extinto. A sua distribuição conhecida restringe-se aos lameiros banhados pela água fresca do rio Coura e afluentes (onde ocorrem populações de milhares de indivíduos graças a um programa de conservação desta espécie cujo sucesso se deve sobretudo à colaboração dos donos dos prados húmidos e do gado que ali pasta), às serras do Caramulo e da Freita, e às margens do rio Ferreira em Valongo; em Espanha só há registos da sua presença na Galiza.
Tempos depois, estes incondicionais fãs ingleses do narciso-de-trombeta descobriram o engano: a floração não decorre em Março ou Abril, mas no início de Fevereiro. Curiosamente, para evitarem a desilusão, bastaria terem reparado que um dos nomes vulgares atribuídos pelos horticultores ingleses às variantes de jardim do N. cyclamineus é precisamente February Gold. Pacientemente, esperaram poder regressar anos mais tarde no mês certo, e rejubilaram com as muitas espécies de Narcissus que nascem em Portugal, tendo até encontrado exemplares de Narcissus x caramulensis, um híbrido natural entre o N. bulbocodium e o N. cyclamineus.