Adónis na velhice
Senecio adonidifolius Loisel.
Os nomes das plantas não estão isentos de paradoxos, muitas vezes involuntários. Senecio é uma palavra latina, aparentadada com "senectude", usada para designar um género de plantas asteráceas que, como muitas outras da mesma família, dão frutos secos (aquénios) envoltos por pêlos brancos (papilhos) que lembram os cabelos dos velhos. Adónis, favorito de Afrodite, símbolo da beleza masculina e da juventude sempre renovada, é a mais completa antítese da velhice. Como poderá alguém ter tido a ideia de juntar os dois na mesma planta? Senecio adonidifolius: senécio a fingir-se de Adónis, ou um velho inconsciente da sua idade envergando roupas de adolescente. Terá havido aqui um propósito caricatural? Ou uma lembrança para os Adónis desta vida que essa condição é passageira e os anos também os hão-de desgastar? Sucede apenas, prosaicamente, que a planta em causa se enquadra no género Senecio e tem folhas quase iguais às plantas do género Adonis. Nem caricatura, nem lição de moral: apenas as leis da biologia combinadas com as regras da taxonomia botânica.
Não é pela forma das folhas que as plantas revelam os seus laços familiares, princípio que é claramente ilustrado por este Senecio cantábrico e pelo Adonis, pertencentes a famílias botânicas (Asteraceae — a dos malmequeres — e Ranunculaceae — a dos ranúnculos) evolutivamente muito afastadas. O que importa é o sistema reprodutor, neste caso as flores, que no Adonis são solitárias e no Senecio adonidifolius (como em quase todas as asteráceas) aparecem aglomeradas em capítulos. Do mesmo modo, o diabo-da-Tasmânia é um marsupial e, por isso, embora as aparências o desmintam, está, em termos evolutivos, muito mais longe de ser cão do que os morcegos.
Em Portugal, é reduzida ou nula a probabilidade de encontrar uma ou outra planta. Há dois Adonis na flora portuguesa, mas só o A. annua é que tem sido visto, e muito esporadicamente: o portal Flora-On regista apenas sete observações. O Senecio adonidifolius, por seu turno, não aparece para cá da fronteira, embora esteja bem disseminado pelas cadeias montanhosas da Península Ibérica — e, saltando os Pirenéus, avance até ao centro de França. Um dos mais distintivos e elegantes do seu género, o S. adonidifolius é vivaz, de floração estival, com capítulos dispostos em corimbos compactos, e caules glabros de 30 a 70 cm de altura.
1 comentário :
Ora é pena não termos visto o adonifolius que há de florescer solitário. Porém, as plantas que florescem em capítulos cativam-me, dar flor capitulando parece-me altamente.
Quanto ao aparente contrasenso da nomenclatura no exemplar exposto...cai como uma seda. Digo que em cada idade nos mudam os olhos e que os velhos podem ser uns para os outros uns adónis ou umas Vénus de Milo (mas com braços, senão ficavam só as manetas, de que haverá poucos espécimes graças a Deus); por outras palavras, os adónis dos velhos não são as crianças de 20, 30, ou 40 anos. É escusado vestirem como adolescentes (se o fazem para parecer mais novos), continuarão da mesma idade. Mas, se é estilo, avante. Velhos progressistas também existem e não deixam de ser velhos. Não têm necessariamente de ser caricatos. Caricato é fingir-se jovem. Temos de gostar de ser o que somos. E acabou.
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