10/04/2016

Em louvor dos taludes


Ferula communis L.
Nas estradas sinuosas das serras da Peneda e do Gerês, não são apenas as curvas que aconselham o condutor a moderar a velocidade. Grupos de vacas ou ovelhas tresmalhadas vão debicando, na maior das calmas, e indiferentes aos automóveis que são obrigados a desviar-se ou a parar, as ervas nem sempre tenras que revestem os taludes. É sorte delas que a canafrecha não cresça nas serranias minhotas, caso contrário essa refeição colhida na berma da estrada bem poderia ser a última. Fossem elas transmontanas de Vimioso, e ao risco de atropelamento próprio de estradas mais rectilíneas somar-se-ia o da ingestão deste apetitoso veneno. A Ferula communis, assim chamou Lineu à canafrecha, é uma das maiores herbáceas da nossa flora, uma haste de mais de dois metros de altura encimada por vistosas bolas amarelas, mas não é pela beleza que um pastor lhe vai perdoar a perigosidade. Não é que seja irremediavelmente mortal como outras umbelíferas (de que se destacam a Oenanthe crocata e o Conium maculatum), mas o seu consumo continuado provoca hemorragias internas que podem ser fatais, em especial para o gado ovino.

Não sendo nós pastores, é com agrado que vemos a canafrecha contribuir para o embelezamento de um dos troços de estrada botanicamente mais ricos do país, como é a EN218 junto ao rio Maçãs, em Vimioso. Herbácea perene de crescimento rápido e com óbvia vocação ornamental, a sua floração em terras nortenhas é tardia, decorrendo numa altura, entre Junho e Julho, em que o fulgor da Primavera já se desvaneceu. A preferência desta umbelífera por lugares alterados e substratos rochosos fazem dela uma frequentadora habitual das bermas de estrada em Trás-os-Montes. Surge mais raramente marginando prados e campos de cultivo, onde, conforme pudemos testemunhar, a sua presença não é bem-vinda: em Campo de Víboras, num passeio em Junho sob um calor impiedosamente estival, encontrámos muitas hastes decepadas ao longo do caminho.

Quem vê a canafrecha em flor não a irá por certo confundir com o funcho (Foeniculum vulgare), que tem uma floração bastante mais discreta, é abundante em terrenos baldios por todo o país, e compensa a desgraciosidade com uma firme reputação culinária. As duas umbelíferas podem contudo confundir-se na fase vegetativa, pois as folhas de ambas são muito divididas, com segmentos de última ordem lineares: compare-se a nossa terceira foto com esta outra da folhagem do funcho. Para evitar enganos, convém estar atento às folhas basais: as da canafrecha (que ninguém no seu juízo há-de querer usar nos seus cozinhados) são bastante maiores e têm um aspecto plumoso muito característico (ver foto).

1 comentário :

bea disse...

Também ignorava que esta planta fosse venenosa. Ainda que jamais pensasse em culiná-la. De jeito ou maneira!