13/11/2023

Arroz cristalizado

Montes de Luna — La Palma, Canárias
O género Monanthes — que, descontando uma espécie nas Selvagens, é exlusivo das Canárias — tem muitas qualidades para merecer o apreço de quem gosta de cultivar suculentas em casa. Sobretudo se a casa for pequena, pois até numa embalagem de iogurte é possível acomodar estas miniaturas. Talvez os detalhes delicados das pequenas jóias que são as flores (de uns 4 a 8 mm de diâmetro) só à lupa se apreciem com justeza, mas o efeito de conjunto é de uma harmonia e simetria inegáveis. Para completar o mostruário que há quatro anos dedicámos ao género, trazemos duas espécies de méritos desiguais, fotografadas nos seus habitats nas ilhas de que são endémicas: a primeira (Monanthes subrosulata) em La Palma, a segunda (Monanthes anagensis) em Tenerife. Ambas são desprovidas de rosetas basais (nisso contrastando com a M. polyphylla, talvez a favorita dos coleccionadores) e apresentam caules ramificados rastejantes ou às vezes pendentes, com as folhas carnudas dispostas em espiral.

Monanthes subrosulata Bañares & A. Acev.-Rodr.


É improvável que a Monanthes subrosulata ganhe concursos de beleza ou atraia o interesse dos aficionados por suculentas, mas deve ressalvar-se que não a fotografámos no seu melhor momento. Vivendo no sul de La Palma, na zona mais árida da ilha, resguarda-se do sol inclemente procurando fendas de grandes rochas vulcânicas. Como precaução adicional, usa os meses mais frescos do ano para florir e frutificar, e em Maio, com as tarefas reprodutivas já cumpridas, mostra-se quase petrificada, como se fosse feita da mesma rocha que lhe serve de casa (quem quiser vê-la com melhor cara pode espreitar esta foto). As folhas rugosas, cobertas de papilas proeminentes, parecem arroz cristalizado, e não permitem confundir esta espécie com nenhuma das suas congéneres. Contudo, ela foi apenas baptizada em 2013, muitos anos depois das restantes espécies do género, a maioria das quais foi descrita ainda durante o século XIX.

Monanthes anagensis Praeger


Se para uma em Maio o ano já acabou, para a outra mal começou. À M. subrosulata chegámos tarde para ver as flores, e à M. anagensis chegámos cedo, mas em ambas as ocasões viajámos no início de Maio. Não haverá outros meses no calendário para visitar as Canárias? Como o nome indica, a M. anagensis vive no maciço de Anaga, no extremo norte de Tenerife, beneficiando da frescura e da sombra da laurissilva: mesmo que não chova, há sempre a humidade trazida pelo nevoeiro e captada pelo arvoredo. Quem quiser observar a planta sem se estafar em caminhadas pode parar o carro em algum dos miradouros da serpenteante estrada de Chamorga e inspeccionar os taludes rochosos. Não precisa de muita sorte para dar com ela: os seus caules pendentes, com folhas estreitas de formato elíptico tingidas de vermelho, formam densos tapetes que se estendem por muitos metros. É bonita de se ver mesmo que não esteja em plena floração, e de facto parece sempre florir com parcimónia. Com alguma paciência, se a visita for entre Maio e Julho, lá se conseguirá ver uma ou outra florita despontando entre a folhagem.

1 comentário :

bettips disse...

É fascinante ver de perto estas maravilhas da arquitectura da Natureza. E mais ainda, como acima explicam, saber que há quem se preocupe em (re)alentar a terra, acarinhando as replantações de plantas que nos parecem "insignificantes".