O campo na cidade
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Ramalde rural - os últimos lavradores.
Corre um brando Outubro. Na horta, arrancadas as canas que suportaram o feijão, foi dada a vez às pencas que crescem viçosas estando já boas para serem cortadas: trabalho de que se encarrega a incansável srª M. Numa pequena fogueira, o sr. L. queima o que não serviu para o composto: vimes e restos de madeiras. Homem espadaúdo, ninguém adivinha que já conta oitenta anos. Doem-lhe um pouco as costas e o que lhe custa mais é "estar quieto".
Perguntou-me se me lembrava das fotografias que lhes tirei estavam eles a sachar o milho, ali onde agora construiram o Pingo Doce. Claro que sim! Foi quase há vinte anos e nessa altura eu fazia questão de pagar pelas couves que me vendiam, pelo menos o que gastava num café. Pediam sempre tão pouco por molhos tão grandes!
E então os netos, perguntei. Como estão? A que se formou em psicologia já trabalha e a outra encontra-se a tirar o doutoramento numa especialidade que não soube dizer. Se os bisnetos alguma vez quiserem cultivar (ou mandar cultivar) o que quer que seja, aqui em Ramalde não será decerto. Eu também gostava de cá não me encontrar quando na horta que vejo da minha janela construirem o prédio que irá tapar o sol.
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4 comentários :
Que bonito!
Infelizmente são cada vez menos as pessoas que sabem desta arte de "amanhar as terras", e quando finalmente acordarmos e nos apercebermos de quanto ela é importante e necessária, quem é que a vai ensinar?
Excelentemente captado este momento, mostra por um lado a invasão do betão, a resistência das gentes e a importância destes espaços junto ao tecido urbano, até para determinadas economias familiares.
Os últimos resistentes à urbanização!
Uma ternura insistente pela terra e a natureza. Com oitenta anos...muitos vêem televisão e queixam-se do mundo. Esta é tb uma história de resistência e amor. Abç
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