03/01/2007

"Não me posso conformar..."

Ao ler (via PJ ) na página da Associação dos Amigos do Mindelo a relação da incrível quantidade de detritos que encontraram ao longo do areal, lembrei-me com nostalgia do belo poema de José Régio. Será que ele se conformaria? E que diria deste megaprojecto?

«Vila de Conde, espraiada
Entre pinhais, rio e mar...
- Lembra-me Vila do Conde,
Já me ponho a suspirar.

Vento norte, ai vento norte,
Ventinho da beira-mar,
Vento de Vila do Conde,
Que é minha terra natal!,
Nenhum remédio me vale
Se me não vens cá buscar,
Venta norte, ai vento norte,
Que em sonhos sinto assoprar...

Bom cheirinho dos pinheiros,
A que não sei outro igual,
Do pinheiral de Mindelo,
Que é um belo pinheiral
que em Azurara começa
E ao Porto vai acabar...,
Se me não vens cá buscar,
Nenhum remédio me vale!
Nenhum remédio me vale,
Se te não posso cheirar...

Vila do Conde, espraiada
Entre pinhais, rio e mar!
- Lembra-me Vila do Conde,
Mais nada posso lembrar.

Bom cheirinho dos pinheiros..
Sei de um que quase te vale:
É o cheiro da maresia,
- Sargaços, névoas e sal -
A que cheira toda a vila
Nas manhãs de temporal.
Ai mar de Vila do Conde~,
Ai mar dos mares, meu mar!,
Se me não vens cá buscar,
Nenhum remédio me vale.
Nenhum remédio me vale,
Nem chega a remediar...

Abria de manhãzinha
As vidraças par em par.
Entrava o mar no meu quarto
Só pelo cheiro do ar.
Ia à praia, e via a espuma
Rolando pelo areal,
Espuma verde e amarela
Da noite de temporal!
Empurrada pelo vento,
Que em sonhos ouço ventar,
Ia à praia, e via a espuma
Pelo areal a rolar...

(...)
Vila do Conde, espraiada
Entre pinhais, rio e mar!
- Lembra-me Vila do Conde,
Não me posso conformar... »


José Régio>
"Romance do Vila de Conde", in Fado (1941)

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