23/06/2009

Jardim das Cidades Geminadas



Deslocarmo-nos de um lugar para outro, nestes dias em que o Verão anuncia de modo desnecessariamente enfático a sua chegada, é um exercício minucioso de cálculo de sombras. Interessa-nos minimizar D, a distância total percorrida, mas maximizando o quociente S/D, onde S é a parte do percurso não sujeita à incidência directa da inclemente luz solar. O que há mesmo a fazer é encontrarmos uma sombra que nos agrade - ou seja, de origem vegetal - e deixarmo-nos lá ficar quietinhos enquanto a situação não evoluir para melhor. No pior dos possíveis cenários, assim que se der o pôr-do-Sol (fenómeno celeste que nestes dias tem ocorrido com notório atraso) a razão S/D atingirá o valor óptimo de 1, e isto independentemente do trajecto escolhido para o regresso a casa.

É nos jardins do Palácio de Cristal que nos acolhem as melhores sombras do Porto, cruzadas pelo chilreio dos pássaros e pelo perfume das tílias e magnólias em flor. E agora, entre a Avenida das Tílias e a Biblioteca Almeida Garrett, novo motivo há para preitearmos a sombra enquanto homenageamos aqueles que, viajando, trouxeram novos mundos ao mundo nos tempos heróicos em que os pacotes da Agência Abreu não incluíam hotéis com ar condicionado. Aos sedentários, como nós, cabe arregalar o olho quando o regressado viajante dispõe à nossa frente as maravilhas que coligiu nas suas circum-navegações. E é uma admiração genuína a nossa, mesclada com gratidão puríssima, em que não entra nanograma de inveja. Quem diria que existiam tão exóticos povos e costumes tão de espantar em tão remotos lugares? E tu, com este calor, foste capaz de lá ir? Uau!

Verdadeiros embaixadores culturais, foram estes viajantes intrépidos a tecer os chamados laços de amizade entre os povos, que se exprimem modernamente pela geminação de cidades e pelos jantares e recepções que os respectivos autarcas se oferecem mutuamente. A geminação é uma espécie de Jardim dos Sentimentos à moda do festival de Ponte de Lima, com fitas garridas transportando amizade recíproca entre diversos pontos do mapa-múndi como antes os fios do telégrafo transmitiam mensagens em código morse. E como não ficarmos agradecidos à Câmara do Porto quando a amizade inter-urbes se materializa em mais árvores e mais sombras?



O Jardim das Cidades Geminadas foi inaugurado no princípio deste mês. Cada cidade geminada com o Porto ofereceu uma árvore ou arbusto que de algum modo a simboliza. Temos assim, em poucos metros quadrados, uma lição de geografia e de botânica que tomámos a previdência de anotar antes que as placas comecem a sumir-se, como é hábito delas. Assim, Vigo ofereceu uma oliveira; Léon, um carvalho-negral (Q. pyrenaica); Duruelo de la Sierra (também em Espanha), um azevinho; Roterdão já tinha dado em 2001 três carvalhos e uma faia; Bordéus deu um medronheiro; Liège, uma pereira; Bristol, uma tramazeira (Sorbus bristoliensis); Brno (República Checa), uma tília-de-folhas-pequenas (T. cordata); Xangai, uma magnólia (M. grandiflora); e Nagasáki fez-se representar por um diospireiro descendente de uma árvore que sobreviveu à bomba atómica. Um painel de azulejos azuis e brancos onde se entrelaçam ramagens floridas assinala do modo mais feliz o novo jardim: é obra de Jesper Andersen, artista dinamarquês que há dias inaugurou, no n.º 36 da rua da Picaria, no Porto, uma exposição de azulejos seus.

5 comentários :

audrey disse...

gostei de ver..........
e
de
ler...................

Anónimo disse...

que bom terem voltado!

Jesper Andersen disse...

muito obrigado pelo comentario, fiquei muito feliz de ter tido a oportunidade para fazer esta obra ; ) jesper.

Paulo Araújo disse...

Ora essa, não precisa de agradecer. Falei dos azulejos porque gostei deles e por achar que mais pessoas os deviam conhecer.

Maria Carvalho disse...

É bizarro que Xangai tenha oferecido um exemplar de Magnolia grandiflora, espécie americana. A China em tantas espécies deste género, por que escolheria uma estrangeira? Suspeito que houve desatenção ao colocarem as etiquetas...