Bastarda & falsa
Melittis melissophyllum L.
Saturno, deus do tempo e das eras, governou o cosmos sob o terror de uma profecia: a de que um dos seus filhos o haveria de destronar. Convencido de que seria capaz de a impedir, planeou devorá-los ainda crianças, menosprezando a fúria materna. Por isso, não se apercebeu de que, ao engolir o mais novinho, comeu um disfarce. E Júpiter cresceu escondido numa gruta, cuidado por ninfas dedicadas e festivas, até estar pronto para a vingança — que cumpriu enquanto venceu uma guerra contra os titãs comandados por Atlas (este, por castigo, carrega até hoje o céu aos ombros). Foi Melissa, a ninfa do mel e das abelhas, que alimentou Júpiter na infância; quando ele se tornou Senhor do Universo, presenteou a sua protectora com uma cornucópia.
Pelo nome, esta herbácea é duplamente melada: melittis é uma variante de melissa, palavra que deriva do grego meli, mel. Muito aromática, não tem contudo as virtudes, quanto à fragância a limão e ao uso terapêutico, da erva-cidreira (Melissa officinalis L.), o que os ingleses sublinham com um descortês bastard balm. Ainda bem, porque a falsa-erva-cidreira é perigosa. Quando seca, rescende a cumarina (um misto de canela e erva fresca, o odor das flores e frutos do castanheiro-da-Índia, Aesculus hippocastanum L.), uma substância tóxica que ajuda a planta a defender-se dos predadores e que, apesar de proibida como aromatizante de alimentos, ainda é usada em cosméticos.
O género Melittis é mono-específico. Vimos este espécime à beira da estrada, junto a um dos muitos regatos que serpenteiam pelo Gerês. E são os prados húmidos e os bosques de sombra da Europa e da Ásia, exceptuando os das regiões frias, que esta planta aprecia; na Península Ibérica, segundo os entendidos, só ocorre no terço norte.
É rizomatosa, logo perene, mas de folhagem caduca. O caule pode chegar aos 90 cm, é penugento e de secção quadrada. As folhas são ovadas mas com um ápice acentuado. As flores são axilares, poucas por cada verticilo, em regra viradas todas para um mesmo lado. O cálice é verde e dentado; a corola com cerca de 4 mm é um tubo largo de cor creme e manchas púrpura no lóbulo inferior e na garganta; o lóbulo superior forma um capuz curto que não esconde os estames.
1 comentário :
Muito nos contam as lendas da mitologia - com a originalidade de nos deixarem a imaginação livre, nos modernos tempos!
Acho que Júpiter viveu "num berço de ouro"!
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