13/06/2011

Língua desaparecida

Ophioglossum vulgatum L.


Nenhum observador ocasional chamaria feto a esta planta, mas é isso mesmo que ela é. A sua parte aérea, que tem 10 a 20 cm de altura, consiste numa folha mais ou menos carnuda, de ápice arredondado, que forma na base uma bainha de onde sai uma haste preenchida na parte terminal com uns vinte a trinta pares de esporângios. O formato dessa haste — a que os entendidos gostam de chamar fronde fértil — foi a óbvia inspiração para os nomes viperinos (língua-de-cobra, adder's tongue) pelos quais a planta é conhecida. É um feto que, preferindo solos pouco ácidos, vive em prados húmidos e clareiras de bosques. A altura ideal para o detectarmos é quando põe a língua de fora, entre Abril e Junho.

Em Portugal é pouco provável que alguém encontre uma destas línguas-de-cobra por acaso. No livro Distribuição de pteridófitos e gimnospérmicas em Portugal, de João do Amaral Franco e Maria da Luz da Rocha Afonso, publicado em 1982, ficamos a saber que o Ophioglossum vulgatum, no nosso país, só se encontra no litoral entre o Douro e o Ave, e ainda no distrito de Bragança já perto da fronteira. Mas as herborizações mais recentes de que temos notícia, na Boa Nova e na Praia da Memória, datam de 1893 e de 1907; e as transformações que esse território entretanto sofreu não permitem grandes optimismos. Quanto a Bragança, Carlos Aguiar, na sua tese de doutoramento sobre a flora e a vegetação do Parque de Montesinho e da Serra da Nogueira, datada de 2000, não refere a existência de qualquer Ophioglossum naqueles lugares. Assim, e até prova em contrário, é de admitir que o Ophioglossum vulgatum já não exista em Portugal.

Na Galiza aqui tão perto a destruição do litoral não atingiu o paroxismo lusitano. E foi na ria de Vigo, junto às dunas que escondem uma praia de nudistas, num prado húmido que ocupou um antigo campo futebol de que ainda sobram as balizas, que vimos todas estas línguas a agitar-se ao vento.

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