08/09/2011

Prata da serra

Paronychia polygonifolia (Vill.) DC.


Será de bom grado que a serra da Estrela nos revela os seus segredos? A pergunta impõe-se face à existência de uma estrada asfaltada, larga e confortável, que nos leva bem até ao cume, rasgando zonas de uma riqueza natural que quase não tem paralelo no nosso país. As raridades botânicas nunca estão a mais de trezentos ou quatrocentos metros da estrada, e às vezes chegam-se mesmo à berma. No Gerês, por contraste, as paisagens mais impressionantes ficam bem afastadas de qualquer rodovia; é preciso fazer uma aprendizagem do território e penar por trilhos acidentados, tantas vezes sem sinalização, antes de vermos o primeiro lírio (Iris boissieri). A Estrela, apesar do recorte apocalíptico dos seus cântaros, perdeu mistério com a democratização do acesso.

Esta versão montanheira da erva-prata (Paronychia argentea, comum no litoral), de seu nome Paronychia polygonifolia, fornece um bom exemplo da caça ao tesouro que perde metade da graça porque o tesouro, afinal, não estava escondido. Só não perde a graça toda porque não deixa por isso de ser um tesouro. Trata-se de uma planta prostrada, de flores minúsculas, que vive em rochas e cascalheiras graníticas no sul da Europa (da Península Ibérica até à Grécia) e no norte de Marrocos. As suas preferências de altitude ditaram que em Portugal ela só se tenha instalado nos patamares superiores da serra da Estrela. Toca então de preparar uma expedição de mochila às costas a que talvez não deva faltar equipamento de escalada. Mas pára-se o carro e eis que vemos a planta a forrar os interstíticios das rochas que ladeiam a estrada. Tudo simples e burocrático, como se visitássemos um jardim botânico com tudo etiquetado; não há aventura, não há esforço, não há o frisson da descoberta.

O nome erva-prata, que não será descabido aplicar a todas as espécies do género Paronychia (em Portugal há três), justifica-se pelas brácteas alvacentas que são a parte mais vistosa da inflorescência. Aliás, um modo fácil de distinguir entre a P. argentea e a P. polygonifolia é que, nesta última, as brácteas são mais pequenas e não ocultam as flores. Outra diferença é que as folhas da P. polygonifolia são menores e mais densamente distribuídas ao longo do caule.

O nome inglês para a Paronychia é nailwort, ou erva-das-unhas. Essa conexão com os nossos dedos está consagrada no próprio nome científico: paroníquia é como se chama a doença, causada por uma bactérica, que provoca uma inflamação da pele junto às unhas. Mas isso não significa que a planta alguma vez tenha sido usada para curar a doença, pois o nome, que foi adoptado pelo botânico Philip Miller (1691–1771) mas já vem dos gregos, pode ter sido por eles aplicado a alguma outra planta.

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