31/05/2012

Mercúrio lanudo

Mercurialis tomentosa L.


Mercúrio, padroeiro dos viajantes e deus dos ladrões, era, como todos as divindades clássicas, uma criatura desprovida de pilosidade corporal. Cabelo tinha, mas curto, da barba nem vestígio, e nenhum pêlo era autorizado abaixo da fronteira do pescoço. Daí se vê que já na infância da civilização os padrões de beleza humana (ou de quem, como os deuses, assumia tal forma) exigiam depilação regular. Curiosamente, nos restantes mamíferos a falta de pêlo sempre foi vista como deformidade ou doença.

Não parece assim apropriado que uma planta tão lanuda como esta seja dedicada a Mercúrio ou a qualquer outro deus do panteão greco-romano. Sucede que a Mercurialis tomentosa é uma singularidade dentro de um género constituído sobretudo por plantas glabras ou esparsamente hirsutas, de que é exemplo a M. ambigua, herbácea ruderal comum até nas cidades. E a M. tomentosa faz também figura de excepção num género que não se destaca pela beleza: a sua folhagem prateada é tão fofa como a da Stachys bizantina, planta muito popular em jardinagem. Só na floração demasiado discreta é que o mercúrio-lanudo fica a perder.

Apesar disso, as flores são talvez a parte mais interessante da planta. A Mercurialis tomentosa é dióica, o que significa flores e femininas e masculinas em indivíduos separados; e, neste caso, de morfologias suficientemente distintas para serem fáceis de distinguir. As flores masculinas aparecem aglomeradas na extremidade de longas hastes que saem das axilas das folhas; as femininas, solitárias ou em grupos de duas ou três, são sésseis, coladas ao caule da planta. Nas fotos vemos exemplos dos dois sexos, com algumas flores femininas já convertidas em frutos.

O mercúrio-lanudo é uma planta perene, ramificada, lenhosa na base, que atinge uns 70 cm de altura e vive em lugares secos e pedregosos. Em Portugal parece ser escassa, embora tenha sido assinalada em meia dúzia de províncias (Algarve, Baixo Alentejo, Estremadura, Ribatejo, Beira Baixa e Trás-os-Montes). Ocorre ainda no sul de França e em quase todas as províncias espanholas. À semelhança de outras congéneres suas, tinha usos tradicionais em medicina popular, tanto como infusão como para aplicação externa.

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