11/11/2012

A graça do delfim

Delphinium gracile DC.


Os marcos geodésicos são pilares cónicos ou piramidais de alvenaria que, no tempo anterior à medição electrónica das distâncias e aos satélites, ajudaram a medir o país (e a fixar em 2000 metros briosos a altura da serra da Estrela). Numa primeira aproximação, a cartografia plana de um mundo mais ou menos esférico exige engenho mas não tecnologia sofisticada. De um lugar elevado, com uma mira apontada a marcos de referência (cuja localização é conhecida com precisão), uma fita métrica e um transferidor, os geógrafos triangularam o país, determinando distâncias entre lugares pouco acessíveis do mesmo modo como, muitos séculos antes, astrónomos gregos haviam calculado a distância da Terra à Lua. Com o advento do GPS, os marcos tornaram-se obsoletos e foram reformados deste seu serviço público, embora a maioria continue de pé. Hoje têm outro encanto: a manutenção desvelada que continua a fazer-se da sua envolvente tem permitido que ali prospere uma flora notável.

Foi junto a um deste marcos, em Trancoso, que encontrámos, entre muitas outras plantas interessantes, dúzias de pés deste «golfinho» airoso e delicado, uma herbácea anual a que os ingleses chamam larkspur. Não parece abundante, a julgar pela distribuição até agora registada na Flora-On, embora não seja de ecologia exigente: vimo-la em terreno seco que parecia uma pastagem em pousio e noutra ocasião à beira de uma estrada em Minde. É nativa da Península Ibérica e do norte de África, mas naturalizada noutras paragens. O género tem cerca de 300 espécies, seis das quais ocorrem em Portugal, além dos híbridos de jardim com flores dobradas, inflorescências densas e cores mais variadas.

As folhas muito divididas e as flores com duas «saias» são característica dos Delphinium. Das cinco sépalas (parecem pétalas) que formam a camada exterior, a mais elevada termina num esporão onde duas das quatro pétalas internas se encaixam para aí esconderem chamativas gotas de néctar. Os polinizadores são em geral abelhões com língua comprida que baste para aceder a esta guloseima.

5 comentários :

Carlos M. Silva disse...

Olá Maria
Se antes ia aos marcos geodésicos por que sim ..para me aproximar dos céus, agora terei outra justificação a juntar a algum geocaching que os usa.
Mas tenho que fazer uma pergunta: j+a fotografei Consolida ajacis e acho que só essa mas pelos vistos é uma importação; decerto a diferença estará na dimensão do esporão? apenas nisso? e já agora, é vulgar encontrar, como dizem, híbridos destas, e de variadas cores; mas são híbridos destes ou da Consolida?
Abraços e lá nos tornaremos a ver na Campo Aberto no fim do mês.
Carlos M. Silva

ZG disse...

Olá!
Tb costumo visitar marcos, sempre que posso, o que não é frequente, na actualidade... mas já visitei certamente mais de duzentos e cinquenta... e vários no concelho de Trancoso!
Posso perguntar qual o nome do marco em questão??
É curioso que encontrei a referida planta junto ao marco de Casteição, um pouco a N de Trancoso, no conc. da Meda, a uma alt. de c. 850 m, sobre granito!
Antecipadamente, muito obrigado!!
Abraço,
ZG

ZG disse...

A informação de qual o marco no conc. de Trancoso terá o maior interesse para citar na minha modesta dissertação de doutoramento, acerca da flora das Beiras (interiores)!
Bem hajam,
ZG

Paulo Araújo disse...

Caro ZG:

As fotos foram tiradas perto de Trancoso, mas não em Trancoso. De facto, as plantas estavam junto do marco geodésico de Casteição, no mesmo local onde o ZG as viu - o qual, ficamos agora a saber, não se situa no concelho de Trancoso mas sim no de Meda.

Abraço,
PVA

Maria Carvalho disse...

Olá Carlos: Tens razão, as flores e a folhagem dos géneros Consolida e Delphinium são semelhantes. O que encontramos muitas vezes à beira da estrada, junto a povoações, são híbridos (escapados de jardins) do género Consolida, que tem inflorescências mais densas. Os híbridos a que aludo são da Royal Horticulture Society e de Delphinium.