28/09/2013

Jardim vertical

Asplenium monanthes L.


A flora das ilhas açorianas, especialmente rica em fetos e aparentados, conta no seu elenco com algumas variações muito interessantes do avencão (Asplenium trichomanes), planta que no continente é muito comum em fendas de rochas e muros com alguma humidade. Nos Açores, o avencão não é nada comum e terá mesmo desaparecido de algumas ilhas; segundo Schäfer (Flora of the Azores — a field Guide, 2.ª edição, 2005), a sua presença no arquipélago quase se restringe a habitats construídos pelo homem. Daí que quem julgar vê-lo por lá deverá inspeccionar o achado com alguma cautela, pois poderá tratar-se do A. azoricum, do raríssimo A. anceps (só no Pico) ou do não assim tão raro feto-de-escoumas, assunto do texto de hoje.

O Asplenium monanthes, que ostenta a distinção de ter sido nomeado por Lineu em 1767 e não ter mudado de nome desde essa data, não é um endemismo açoriano; sem deixar de ser nativo do arquipélago, é das plantas mais viajadas que lá se encontram. Já Lineu, na descrição original, dava conta do seu vasto território de ocorrência: América desde o estado do Arizona até ao Chile; ilhas do Havai; África meridional incluindo ilhas atlânticas (Tristão da Cunha, Ilha Inacessível). A que se pode acrescentar Açores, Madeira, Madagáscar e a ilha da Reunião. Este pequeno feto, com folhas de uns 20 cm de comprimento, é um bilhete para a nossa imaginação discorrer por lugares que nunca visitaremos.

O formato peculiar das pinas (confira na segunda e terceira fotos) garante que o observador atento não irá confundir o Asplenium monanthes com algum dos seus primos. O epíteto monanthes, que significa "uma só flor", explica-se por cada pina ter em regra um único soro (agrupamento de esporângios) na página inferior. Enigmático é o nome vernáculo feto-de-escoumas, usado tanto na Madeira como nos Açores.


Terceira: estrada Angra-Biscoitos junto ao Pico da Bagacina
Na Terceira, o A. monanthes encontra-se esporadicamente sob coberto de urze e outros matos, em muros húmidos e bem assombrados, por vezes mesmo em taludes de estradas. O talude com maior biodiversidade em toda a ilha é por certo este junto ao Pico da Bagacina: um jardim autóctone mortalmente perigoso para quem o contemple sem prestar atenção aos bólides que correm disparados pela estrada. Os altos paredões, rasgados para fazer passar a via, são refúgio para plantas que já não existem nos montes adjacentes, convertidos em pastagens. Uma lista incompleta inclui, além do A. monanthes, da urze e da torga, as seguintes especialidades: Huperzia dentata, Platanthera micrantha, Vaccinium cylindraceum, Leontodon filii, Lysimachia azorica, Asplenium scolopendrium, Centaurium scilloides, Hypericum foliosum, Polypodium azoricum, Myrsine retusa, Laurus azorica e Woodwardia radicans.

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