06/05/2014

A ínula e a lampreia


Inula salicina L.
Nos últimos 75 Km do seu curso, onde serve de fronteira entre Portugal e a Galiza, o rio Minho não tem qualquer barragem, seja para produção eléctrica ou para armazenamento de água. É um troço que lhe permite recuperar alguma da espontaneidade cerceada pelas cinco grandes barragens que fraccionam o seu deambular pela Galiza, a última delas (a de Frieira) situada a menos de 500 metros da fronteira portuguesa. E o nosso rio Minho, livre de paredões monstruosos, tem humores e encantos que o galego rio Miño desconhece. Para começar, há as marés. Uns anos atrás, ao visitarmos uma «ilha» perto de Valença, atravessámos sem dificuldade, de galochas calçadas, um braço do rio com água pelas calcanhares. Pareceu-nos normal que o rio levasse pouca água no Verão. No regresso, o cenário tinha mudado por completo: a água dava-nos pelos joelhos, e se esperássemos mais uns minutos chegar-nos-ia à cintura. Uma lição prática inesquecível: mesmo a 60 Km da foz, como comprovámos depois em Melgaço, o rio Minho enche e esvazia diariamente ao ritmo das marés. E é também a ausência de obstáculos artificiais que permite a subsistência do salmão e da lampreia que muita gente pesca nas suas águas.

Porque no espírito tacanhamente utilitário de alguns um rio sem barragens significa um desperdício, de tempos a tempos surgem tentativas de alterar este estado de coisas. Nos anos 90 do século passado a ameaça era a construção da barragem luso-espanhola de Sela, no troço entre Monção e Melgaço. Abandonado o projecto, eis que ele ressurge, com outro propósito e roupagens quiçá mais brandas, sob o título de Estação Elevatória de Troporiz, uma das alternativas que a empresa Águas do Minho e Lima considerou, entre 2002 e 2005, para a construção de uma nova barragem de captação de água. Em maior ou menor grau, cada um destes projectos teria resultado na artificialização do rio e em perdas patrimoniais e ambientais irreparáveis. Ter-se-iam afogado as pesqueiras de Monção e de Melgaço, construções quase milenares que se confundem com a rocha esculpida pela força do rio. Ou, se não se afogassem, deixaria de haver peixe para nelas ser apanhado. E perder-se-iam importantes populações (no caso de Nymphoides peltata, talvez a última população) de algumas das espécies vegetais mais ameaçadas do nosso país (como o feto-dos-brejos).

Talvez a Inula salicina não seja assim tão rara nem esteja sob particular ameaça. É, no entanto, bastante escassa em Portugal, e até hoje só a conhecemos das pesqueiras de Melgaço. No nosso país, a sua predilecção por afloramentos pedregosos em leitos de cheia terá por certo ajudado à sua rarefacção, mas no resto da Europa, onde está amplamente distribuída, assume uma ecologia algo diferente: como nos informa Franco no vol. 2 da Nova Flora de Portugal, prefere «sítios húmidos e clareiras de matas caducifólias». É uma planta perene, rizomatosa, de hastes até 70 ou 80 cm de altura, e folhas ovadas, semi-coreáceas, as caulinares sésseis, quase amplexicaules. Reconhece-se com facilidade pelas brácteas involucrais compridas e salientes (veja na 2.ª foto). Os capítulos florais são grandes, com 3 a 4 cm de diâmetro, e surgem entre Junho e Agosto.

2 comentários :

bea disse...

A natureza é a natureza, a preservação (ou a falta dela) afecta as espécies vegetais como as animais

Anónimo disse...

Vi-a o ano passado num leito rochoso do Tua. Em breve desaparecerá desse local.
AC