Fajã dos goivos amarelos
A ilha da Madeira não tem praias de areais extensos, com areia fina e clara, como as do Porto Santo. Onde o bordo da ilha é acessível, há em geral umas pouco convidativas pedras roladas de cor cinza para deter os avanços do mar em dias de tempestade. No mais, as escarpas são a pique, sem escadinhas que sirvam a descida, e o chão é de terra e rocha perigosamente soltas. Contudo, se olharmos o fundo destas falésias com atenção, quase sempre se divisam campos de cultivo verdejantes, ramadas de vinha ou maracujá, além de casinhas minúsculas, gatos e abóboras. Em resumo: há por ali gente. Como conseguem vencer tais precipícios? A solução, nesta ilha onde as estradas percorrem muitos quilómetros em túneis, num sobe e desce enervante, mas raramente nos levam às fajãs, está num par de teleféricos.
Enquanto num deles descemos receosos, abanados pelo vento de Dezembro, o outro sobe calmamente, vazio ou com turistas animados a fotografar. Antes que o pânico nos domine, chegamos a terra e, já serenos e a rir do medo, ouvimos as ondas, aquecemos os pés e saboreamos o ar salgado. Estamos no litoral sul da Madeira, entre Cabo Girão e Câmara dos Lobos, e as fajãs deste trecho de costa são dos poucos lugares da ilha onde o micro-clima permite o cultivo de frutos tropicais. Mas não foi pelas plantas cultivadas que aqui viemos. Uma das plantas espontâneas que atraiu a nossa atenção foi esta de flores amarelas.
Pela semelhança com as três espécies do género Erysimum que conhecemos por cá (ainda que na Península Ibérica ocorram mais de vinte) e a de Porto Santo, supusemos inicialmente que este arbusto se filiava nesse género, até por sabermos que o Erysimum maderense, endémico da Madeira e de flores amarelas, frequenta as falésias próximas do Cabo Girão. Mas a base avermelhada das pétalas e as folhas glabras, algo suculentas, desmentiam essa identificação. E, de facto, o que vimos foi o Sinapidendron angustifolium, pertencente a um género que é endémico da Madeira e que conta com quatro ou cinco espécies colonizando habitats muito variados. Este arbusto prefere as vertentes ensolaradas do sul da ilha, onde é razoavelmente abundante, e não deveria florir em Dezembro; na costa norte da Madeira é substituído por um congénere de folhas muito diferentes, mas de flores e frutos semelhantes, que a seu tempo aqui mostraremos.
Junto ao mar, não há fiscal a controlar os bilhetes do teleférico, nem sequer um painel com horários. Vê-se apenas uma câmara de segurança que verifica se há passageiros à espera para subir, ou estes simplesmente accionam um botão para que a próxima viagem se inicie. Na subida, já não receámos sentar-nos voltados para o mar, a vê-lo afundar-se bordejado de pintinhas amarelas.
2 comentários :
Duvido mesmo muito que eu tivesse a vossa coragem para o teleférico, mas deve ser uma paisagem bonita de ver. Os goivos também não me entusiasmam por aí além.
BFS
O impossível da Natureza (e os humanos).
Abçs
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