07/02/2017

Fajã dos goivos amarelos

A ilha da Madeira não tem praias de areais extensos, com areia fina e clara, como as do Porto Santo. Onde o bordo da ilha é acessível, há em geral umas pouco convidativas pedras roladas de cor cinza para deter os avanços do mar em dias de tempestade. No mais, as escarpas são a pique, sem escadinhas que sirvam a descida, e o chão é de terra e rocha perigosamente soltas. Contudo, se olharmos o fundo destas falésias com atenção, quase sempre se divisam campos de cultivo verdejantes, ramadas de vinha ou maracujá, além de casinhas minúsculas, gatos e abóboras. Em resumo: há por ali gente. Como conseguem vencer tais precipícios? A solução, nesta ilha onde as estradas percorrem muitos quilómetros em túneis, num sobe e desce enervante, mas raramente nos levam às fajãs, está num par de teleféricos.



Enquanto num deles descemos receosos, abanados pelo vento de Dezembro, o outro sobe calmamente, vazio ou com turistas animados a fotografar. Antes que o pânico nos domine, chegamos a terra e, já serenos e a rir do medo, ouvimos as ondas, aquecemos os pés e saboreamos o ar salgado. Estamos no litoral sul da Madeira, entre Cabo Girão e Câmara dos Lobos, e as fajãs deste trecho de costa são dos poucos lugares da ilha onde o micro-clima permite o cultivo de frutos tropicais. Mas não foi pelas plantas cultivadas que aqui viemos. Uma das plantas espontâneas que atraiu a nossa atenção foi esta de flores amarelas.



Sinapidendron angustifolium (DC.) Lowe


Pela semelhança com as três espécies do género Erysimum que conhecemos por cá (ainda que na Península Ibérica ocorram mais de vinte) e a de Porto Santo, supusemos inicialmente que este arbusto se filiava nesse género, até por sabermos que o Erysimum maderense, endémico da Madeira e de flores amarelas, frequenta as falésias próximas do Cabo Girão. Mas a base avermelhada das pétalas e as folhas glabras, algo suculentas, desmentiam essa identificação. E, de facto, o que vimos foi o Sinapidendron angustifolium, pertencente a um género que é endémico da Madeira e que conta com quatro ou cinco espécies colonizando habitats muito variados. Este arbusto prefere as vertentes ensolaradas do sul da ilha, onde é razoavelmente abundante, e não deveria florir em Dezembro; na costa norte da Madeira é substituído por um congénere de folhas muito diferentes, mas de flores e frutos semelhantes, que a seu tempo aqui mostraremos.

Junto ao mar, não há fiscal a controlar os bilhetes do teleférico, nem sequer um painel com horários. Vê-se apenas uma câmara de segurança que verifica se há passageiros à espera para subir, ou estes simplesmente accionam um botão para que a próxima viagem se inicie. Na subida, já não receámos sentar-nos voltados para o mar, a vê-lo afundar-se bordejado de pintinhas amarelas.

2 comentários :

bea disse...

Duvido mesmo muito que eu tivesse a vossa coragem para o teleférico, mas deve ser uma paisagem bonita de ver. Os goivos também não me entusiasmam por aí além.
BFS

bettips disse...

O impossível da Natureza (e os humanos).
Abçs