06/09/2020

Alface azul



Lactuca perennis L.


Num país onde, preguiçosamente, os restaurantes tradicionais desistiram de temperar a comida com outra coisa que não seja sal, azeite e vinagre, e as ervas aromáticas são conhecidas só de nome, há ainda vegetais que são amplamente cultivados e consumidos. Entre eles avulta a alface, que é omnipresente em saladas e surge com irritante assiduidade como elemento decorativo em pratos irremediavelmente desenxabidos.

Da alface o consumidor médio só conhece as folhas; e, como a planta é colhida ainda tenra, mesmo quem a cultiva não costuma ver-lhe as flores. Assim, as primas silvestres da alface domesticada (Lactuca sativa) raramente são reconhecidas como tal, apesar de serem muito abundantes e florirem maioritariamente entre Junho e Agosto, época do ano em que desperta nos citadinos um breve entusiasmo pelas coisas da natureza. Sendo geralmente comestíveis, embora por vezes amargas, o uso dessas alfaces espontâneas traria, além da poupança, uma bem-vinda variedade à culinária caseira.

Nem a alface das hortas nem as alfaces silvestres (pelo menos as que se encontram em Portugal continental) são exemplos acabados de elegância, e pouca gente as quererá ter num jardim. O caso é outro se falarmos da assombrosa alfacinha açoriana (Lactuca watsoniana), que contudo nunca parece ter sido cultivada. Ficando-nos pela Península Ibérica, encontramos no país vizinho algumas alfaces compostinhas e de floração atraente. Uma delas, a que pela cor das flores podemos chamar alface-azul, é a Lactuca perennis, que vive em rochas (preferencialmente) calcárias e floresce na Primavera. As suas flores têm semelhanças óbvias com as da chicória (Cichorium intybus), planta muito vulgar em Portugal, tanto no continente como nas ilhas.

Distribuída por grande parte do centro e sul da Europa, a Lactuca perennis é uma planta compacta, com 30 a 80 cm de altura, que apresenta inflorescências corimbosas, formadas por capítulos esparsos, cada um deles com 12 a 20 lígulas variando entre o azul e o lilás. Havendo por esse mundo fora quem coleccione plantas como outros coleccionam objectos inanimados, a alface-azul tem por certo lugar de eleição no rock garden de muitos entusiastas.

2 comentários :

bettips disse...

Por acaso, lembrei-me agora, na mocidade "com quintal", o meu pai tinha o hábito de deixar algumas couves, abóboras,fetos e afins, como decoração. Foi aí que aprendi a importância e a beleza das flores comuns. Esta é de uma beleza levissima.
Abçs

Unknown disse...

A longa viagem da alface que se degusta nos nossos pratos, ainda que escassos, adicionem chicórias, rúculas e orégãos. Esta planta fez-me viajar meio século à infância nos calcários. Parabéns pela vossa publicação.