14/09/2020

Erva-azul dos gatos

Uma das afirmações mais intrigantes que a ciência nos deu no século XX é a de que não é possível medir o tempo de modo universal. Dito assim, soa complicado, porque o conceito de tempo é criação nossa e, portanto, não deveria poder fugir ao nosso controle. Na verdade, embora todos usemos fracções da hora para o medir, e os relógios sejam cada vez mais precisos, o tempo não tem carácter absoluto: a velocidade a que passa depende do nosso próprio movimento; e quanto mais depressa vamos, mais lentamente ele decorre. Depois da nossa visita ao Castro de Santiago, em Mogadouro, a que se acede vagarosamente por ladeira íngreme e pedregosa, sem sombra que alivie o calor desmedido, esta relatividade do tempo ganha outro sentido: o tempo é tão rápido a passar que só ao fim de 1 hora, e uns tantos impropérios, completamos um percurso que julgámos ser capazes de percorrer em vinte minutos.



No topo do castro, porém, ao vermos esta planta fabulosa em flor na orla do bosque, damos o esforço da subida como bem empregue, e a nossa aflição com o tempo gasto é agora apenas um problema para resolver à descida.


Nepeta caerulea Aiton


Estamos na extremidade sudoeste da serra do Variz, a cerca de 950 metros de altitude, junto a um cume quartzítico de onde se avista o planalto de Miranda. Aqui há um mato ralo mas bem conservado de carvalho-negral (Q. pyrenaica) e um coberto vegetal que, uns meses antes do Verão, deve ter mostrado uma variedade notável de herbáceas. Lamentavelmente, abriram-se por ali vários estradões que, ainda que nos poupem segundos na subida e tenham revelado aos historiadores indícios de um povoado da Idade do Ferro que ali existiu, poderão destruir um habitat raro, que se julgaria parado no tempo.

O género Nepeta bem pode orgulhar-se de só ter espécies vistosas, algumas com hastes florais que ultrapassam 1 metro, outras de porte baixo mas entre as plantas mais formosas que conhecemos. Da N. caerulea, que é um endemismo da Península Ibérica, conhecem-se poucos núcleos em Portugal e quase todos com poucos indivíduos.

2 comentários :

Unknown disse...

Mogadouro berço da natal de Trindade Coelho, que em Os Meus Amores louva a sua infância na sua terra mãe. Que maravilha ler este texto de um planta que observa o planalto de Miranda do Douro. Parabéns.

bettips disse...

Tão bonito, tão longe! Tudo, o esforço e as flores de compensação.
Abçs