11/01/2024

Dueto para trombetas



Falamos hoje de plantas do género Convolvulus. O nome vem-lhes da tendência para treparem, a poder de talos, por outras plantas acima. Não é o mesmo, entenda-se, que ser parasita. Apesar de tudo, gasta-se energia numa subida que, quando feita em hélice, enroscando os ramos em troncos alheios, exige também um controle das vertigens. Para as plantas trepadeiras, trata-se de aproveitar a estrutura e o espaço dos outros para aceder a mais horas de sol e, se preciso for, ensombrar integralmente quem serve de escada. Que haja uma palavra delicada, convolvulus, para descrever o ataque ao território de um vizinho, comprometendo a sua sobrevivência, mostra como a linguagem humana se amansou. Para condenar a barbárie, que ultimamente vem exibindo no mundo um arrojo desmesurado, já pouco vocabulário nos resta. Nem suspeitávamos que corríamos esse perigo.

Convolvulus canariensis L.


Na Península Ibérica conhecemos apenas uma espécie de Convolvulus que é arbustiva, com talos inferiores lenhosos e os superiores flexíveis: o Convolvulus fernandesii, com 20 a 60 cm de altura, endemismo do Cabo Espichel que vive em escarpas de arribas calcárias à beira mar. Há semelhanças morfológicas, mas não de habitat, entre esta corriola lenhosa e algumas espécies das Canárias, como o C. lopezsocasii, endemismo de Lanzarote cuja distribuição se restringe a ladeiras rochosas do Maciço de Famara (430-600m de altura), ou o C. canariensis (fotos acima), que aprecia os ares dos barrancos de montanha (400-1000m), e ocorre em El Hierro, La Palma, La Gomera, Tenerife e Grã-Canária. De facto, um artigo de 2004 da autoria de Mark Carine e outros confirma, com elevado grau de certeza, que o C. fernandesii se integra na linha evolutiva dos Convolvulus das Canárias, e é resultado de uma colonização recente do continente português a partir desse arquipélago.

A lista de endemismos do género Convolvulus nas Canárias que são parentes próximos do C. fernandesii é longa: há pelo menos nove, sem contarmos com subespécies, quase todos arbustivos. As próximas fotos, tiradas em Montes de Luna em La Palma, mostram uma subespécie do C. fruticulosus que essa ilha partilha com El Hierro e Tenerife. As flores dessa corriola, que habita encostas rochosas costeiras, são de cor violácea e nascem entre Março e Maio.

Convolvulus fruticulosus Desr. subsp. fruticulosus


Notem como as folhas são verde-acinzentadas, de pecíolo curto, e como toda a planta é muito penugenta. Desta espécie é conhecida outra subespécie no sul da Grã-Canária, uma trepadeira de folhas pegajosas e flores brancas de Inverno. Vendo bem, sobram poucos meses no ano (Outubro e Novembro) em que não há oficialmente corriolas floridas nas Canárias.

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