17/02/2025

Simplesmente branco

O branco, cor da pureza ou soma de todas as cores, é escolhido por muitas plantas para as suas flores. Não há inocência nem virgindade no gesto: o que elas querem é atrair polinizadores e ser fecundadas. Será possível correlacionar o sucesso reprodutivo com a cor das flores? É improvável. Se houvesse uma cor que suplantasse claramente as outras, então o processo evolutivo teria há muito determinado que essa fosse a única cor floral autorizada. Olhando à nossa volta, o amarelo parece ser dominante entre as plantas de floração hibernal, embora ele provenha em grande parte das exóticas (e daninhas) acácias e azedas. Mas também há malmequeres brancos que escolhem o Inverno para florir: por esta altura do ano, é o Chamaemelum fuscatum que cobre de branco os olivais de norte a sul do país. E quando chegar a Primavera juntar-se-ão à festa muitas outras cores, cada uma com os seus argumentos de sedução mas apostando forte no efeito do conjunto.

Visto do nosso cantinho europeu, o género Echium é pouco dado a variações de cor: à excepção do Echium boissieri, com flores de um branco leitoso, todas as espécies continentais portuguesas têm flores roxas ou azuis. Na Madeira, onde o género foi sujeito aos afamados processos insulares de agigantamento e lenhificação, as três espécies endémicas repartiram entre si as cores disponíveis: azul, roxo e branco. Mas no Echium portosanctensis, a quem coube a cor alva, o branco da corola é disfarçado pelo rosa dos estames proeminentes.

Foi nas Canárias que os Echium mais se diversificaram, tanto no hábito e envergadura das plantas como na coloração das flores. Para uma amostra incompleta de quão diversas podem ser estas boragináceas numa só ilha (neste caso a de La Palma), aconselha-se uma espreitadela a este texto. Além das cores aí ilustradas, há ainda, em Tenerife, o vermelho do tajinaste do Teide; e, distribuídos por diversas ilhas, encontram-se os massarocos de flor branca que são assunto do texto de hoje.

Echium simplex DC.


Quem mais se destaca entre eles é o Echium simplex, endemismo de Tenerife, restrito a zonas pedregosas de média e baixa altitude do maciço de Anaga, no nordeste da ilha. À semelhança do E. wildpretii e do E. perezii, o E. simplex apresenta um caule não ramificado (ou simples, como informa o epíteto) de dois a três metros de altura que emerge de uma grande roseta de folhas basais; e, tal como os outros dois, é uma planta monocárpica: cada indivíduo demora vários anos até florir, mas esse apogeu, marcado pela produção de assombrosa quantidade de sementes, assinala o seu fim.

Vítima das cabras assilvestradas que lhe devoram as rosetas, o Echium simplex tornou-se raro na sua área de distribuição natural. Um modo de acautelar a sua sobrevivência é o cultivo em jardins. O local onde moravam as plantas das fotos aí em cima era um jardim contaminado pela natureza: situando-se em Anaga, talvez as plantas tivessem lá ido parar por sua livre vontade; em todo o caso, já tinham extravasado o muro e cresciam junto ao caminho.

Echium aculeatum Poir.


Os outros dois massarocos de flor branca que temos para mostrar são arbustos lenhosos de médio porte. O Echium aculeatum é mais frequente em La Gomera, mas existe também em El Hierro, La Palma e Tenerife. As flores, que apresentam corola comprimida na base e cálice com lóbulos lineares muito alongados, concentram-se nas extremidades dos ramos, e têm efeito ornamental modesto. É pelas folhas que o Echium aculeatum mais facilmente se distingue de espécies próximas (como o E. leucophaeum): são coriáceas e têm as margens pontuadas por pêlos duros e híspidos; é a isso que se refere o epíteto aculeatum.

Echium bethencourtii A. Santos


O E. bethencourtii, endémico das escarpadas falésias do norte de La Palma, compensa o porte mais rasteiro com inflorescências cilíndricas vistosas, composta por flores bem abertas e destacadas dos cálices. As folhas são largas e desprovidas de acúleos agressivos. É uma planta que faria boa figura em jardins, e que só não é mais conhecida e cultivada porque, dentro do género a que pertence, a concorrência é muito forte.

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