21/11/2025

Virtudes da maleza



No sul da província de Almeria, a mancha branca das estufas estende-se da costa até ao sopé da serra de Gádor, lambendo-lhe os pés como se fosse um grande lago defeituoso, incapaz de reflectir o recorte da montanha. Dos cumes descem barrancos que, de muitos em muitos anos, podem converter-se em ribeiras torrenciais quando há borrasca da grossa. Subimos por um dos barrancos, escolhido mais ou menos ao acaso, num dia de Abril em que a chuva, posto que moderada, fez questão de marcar o ponto. Talvez a nossa presença tenha induzido as nuvens a confundir as áridas paisagens andaluzes com as verdes paragens nortenhas.

Rambla de la Maleza era como se chamava o barranco em questão. Rambla é o nome que se dá em espanhol ao leito seco de um rio, e maleza significa mato ou vegetação rasteira. Nome inteiramente apropriado, mas que se ajustaria não menos bem a muitas dezenas de acidentes geográficos similares na mesma região. Como é nossa sina, foi a maleza que nos trouxe a este lugar, a maleza que em Almeria nunca nos deixou ficar mal. Em seguida mostramos três das plantas mais assinaláveis que compunham a maleza desta rambla.

Convolvulus lanuginosus Desr.


Vulgarmente conhecidas como corriolas, as plantas do género Convolvulus e de outros géneros aparentados (como Ipomoea e Calystegia) reconhecem-se pelas flores em forma de trombeta, sem pétalas individualizadas. Muitas delas são herbáceas anuais, sendo esse o caso da espécie mais comum em Portugal, Convolvulus arvensis, e de várias outras que surgem sobretudo na metade sul do país: C. tricolor, C. siculus, C. meonanthus e C. humilis. Em contraste com estas temos as espécies lenhosas, de que a maioria vive nas ilhas da Macaronésia (exemplos aqui e aqui) mas contando-se entre as excepções o Convovulus fernandesii, endemismo da serra da Arrábida. O Convolvulus lanuginosus, que acima ilustramos, situa-se entre estes dois extremos por ser uma herbácea perene de base lenhosa. Os caules, erectos ou prostrados, densamente penugentos, atingem os 60 cm de comprimento, as folhas são lineares e sésseis, e as flores, de um cor-de-rosa pálido, têm uns 3 cm de diâmetro. Ausente de Portugal, distribui-se pela costa mediterrânica de Espanha, sul de França e Marrocos.

Carthamus arborescens L.


Sendo incontroverso que cardos há muitos, o cardo-arbóreo (Carthamus arboreus) exibe uma envergadura que o impõe a toda a concorrência: atinge os três metros de altura, e as suas hastes grossas, muito ramificadas, são bastamente guarnecidas com folhas coriáceas e espinhentas. Apesar de a floração ser ainda incipiente no início de Abril, não podíamos deixar de aqui registar o nosso encontro com um gigante que, à sua maneira, não deixa de ser amável — se nos mantivermos a uma distância respeitosa.

Genista spartioides Spach


Tal como as duas plantas anteriores, esta giesta, de seu nome Genista spartioides, não existe em Portugal, embora não nos faltem giestas de aspecto semelhante. Uma delas é a G. cinerascens, que ocorre em Trás-os-Montes e na Beira Alta: é também uma giesta sem espinhos, de porte não muito elevado (fica-se pelo metro de altura), com caules profundamente estriados. É instrutivo notar, porém, que a G. cinerascens tem folhas persistentes, presentes em simultâneo com as flores, enquanto que as folhas da G. spartioides são muito fugazes, em geral ausentes aquando da floração. Além disso, e como se observa na última foto acima, as flores da G. spartioides têm uma quilha muito saliente, que por vezes quase duplica o comprimento das asas. Esta última característica permite facilmente destrinçar a G. spartioides de congéneres suas que ocupam habitats semelhantes na província de Almeria. Sirva de exemplo uma quase sósia da G. cinerascens, a G. jimenezii, ilustrada abaixo com fotos obtidas no Cabo de Gata.

Genista jimenezii Pau

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