Espaços verdes de papel
«Há palavrões modernos, que são espantalhos. Inventam-se para espantar, fazer fugir ou pôr de boca aberta as criaturas simples. Levam a palma aos figurões de cartola, postos de sentinela no topo das figueiras para amedrontar a pardalada. Levam-lhes a palma, porque não guardam coisíssima nenhuma. Se há figos a defender, justifica-se o espantalho no alto da figueira. Mas, os palavrões que se inventam para impor respeito ou meter medo não correspondem à realidade. Correspondem a mitos, poeticamente inventados para iludir pategos.
Zona Verde, mais que palavrão, é um desses espantalhos. Não há zonas verdes num país que jurou guerra de morte ao arvoredo. Mas, inventaram-se, como flores de retórica, para se dizer que são indispensáveis em terra esperta, conhecedora dos segredos do oxigénio, coisa muito fina e que faz bem à saúde.
Não há terra nem terrinha que não tenha destruído árvores para se civilizar. Todas entendem que o ideal da civilização é a eira varrida, limpa de praganas. Mas, por sábio respeito às magias do oxigénio, concordam com as zonas verdes, sob condição de nunca reverdecerem. (...)
Também a nossa vila tem zona verde. Por ser nossa, é a mais bonita de quantas luzem, no papel, por esse país fora. (...)
O Turismo é fonte de receita. Mas, sem fontes de água e sem árvores, sem agasalho doce, o Turismo não pega. Para haver Turismo, são indispensáveis os requisitos de hospitalidade. No pino do Verão, à parte a mesa bem servida e cama limpa, um dos requisitos é a água, a sombra, a frescura, o canto dos passarinhos, uma boa migalha de natureza.»
João de Araújo Correia, Pátria Pequena (1977)
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