16/12/2009

Azedas-bravas


Rumex acetosa L.

O livro French Provincial Cooking, de Elizabeth David, foi precedido por um volume menor, French Country Cooking, uma pequena colecção de receitas da cozinha tradicional francesa tratadas com reverência e - garantia de que foram experimentadas - condimentadas com juízos, inspiradores ou divertidos, sobre as dificuldades de preparação e os resultados a esperar. A autora viveu em Paris como estudante de História e Literatura Francesas, na Sorbonne, e o livro regista os méritos que então provou da haute cuisine e da cuisine bourgeoise, destinando-se a resourceful housewives and enterprising chefs dotados do humor adequado na abordagem culinária: a devoted, determined spirit, but not, it is to be hoped, one of martyrdom. Publicado em 1951, quando ainda vigoravam os racionamentos posteriores à guerra, o texto tem o cuidado de informar em várias receitas que ingredientes podem substituir, sem prejuízo para o paladar, os que o leitor não encontrar disponíveis.

Também na culinária, os parisienses conseguiram estabelecer modas, assegurando mesmo à gastronomia relevância académica: a arte de bem cozinhar é matéria de ensino, como a pintura ou a música. Não tendo nós um paladar exigente ou apurado, nem tempo para apreciar a maioria dos acepipes requintados destes dois textos, reparámos contudo que, não esquecendo um índice remissivo e uma lista bibliográfica comentada (raridades em muitas obras de hoje), E. David assinala várias tendências interessantes da nouvelle cuisine, sabores impertinentes e quase exóticos nos prazeres à mesa francesa a meio do século passado. Uma delas é o vasto uso de molhos avinagrados, em particular os preparados com folhas de azeda-brava (em inglês, sorrel; em francês, oseille), que dão um sabor ácido a sopas, saladas, purés, molhos, etc., e foram em tempos usadas para embrulhar manteiga. Têm, além disso, efeito diurético e um elevado teor de vitamina C. Elizabeth David avisa que é então difícil encontrar azeda-brava em Inglaterra. Para confeccionar Colin à l'oseille, purée d'oseille (it may be hard to believe, but a purée of green gooseberries, barely sweetened, with the same additions of cream and stock, is almost indistinguishable from this one) ou omelette à l'oseille, os londrinos teriam de a comprar em hortos ou mercados especializados. Curioso negócio este: azedas é o que não falta, a julgar pelo que vemos hoje, em baldios, terrenos incultos ou em pousio, margens de regatos e solos arenosos.

A vinagreira é uma planta vivaz de crescimento rápido, podendo atingir um metro de altura, que está presente em quase toda a Europa, Ásia não tropical e América do Norte. Em vários detalhes lembra a trepadeira-russa. As folhas são lineares, oblongas e inteiras; as basais com cerca de 10cm de comprimento e um limbo em forma de seta com pecíolo longo; as superiores sésseis, abraçadas ao caule, rubras no Verão. A floração decorre de Março a Setembro, e as flores esverdeadas ou róseas nascem dispostas em inflorescências ramosas terminais (flores masculinas e femininas em plantas distintas). A polinização é tarefa do vento e o fruto é uma cápsula castanha triangular de textura fina (feita de três sépalas aumentadas e unidas) com uma semente.

Esta espécie hibrida facilmente, confundindo os esforços de identificação. A Rumex acetosa tem uma parente próxima igualmente abundante na Europa, a R. acetosella L., que se distingue daquela por ter menor porte e folhas mais pequenas, com lóbulos revirados para o ápice da folha, e por ser estolonífera (isto é, desenvolve estolhos, caules rastejantes que emitem raízes a espaços regulares).

2 comentários :

Isabwl disse...

Bom dia
Gostaria de saber se a azeda é a mesma planta que a “língua de vaca”. A floração e sementes são muito sEmelhantes ou até iguais, mas não sei.
Obrigada
Isabel Vasconcelos

Paulo Araújo disse...

Os nomes comuns prestam-se a grande confusão. Em Portugal são várias as plantas conhecidas como língua-de-vaca, mas tanto quanto sei nenhuma delas tem qualquer semelhança ou parentesco com a planta das fotos.